segunda-feira, 20 de novembro de 2017

20 de Novembro - Dia Nacional da Consciência Negra

20 de Novembro - Dia Nacional da Consciência Negra

Datas Comemorativas

O Dia Nacional da Consciência Negra é comemorado em 20 de novembro, dia da morte de Zumbi dos Palmares, e reivindica essa figura histórica como símbolo de resistência.
Monumento a Zumbi dos Palmares em Salvador, Bahia*
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O Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, foi instituído oficialmente pela lei nº 12.519, de 10 de novembro de 2011. A data faz referência à morte de Zumbi, o então líder do Quilombo dos Palmares – situado entre os estados de Alagoas e Pernambuco, na região Nordeste do Brasil. Zumbi foi morto em 1695, na referida data, por bandeirantes liderados por Domingos Jorge Velho. Maiores informações podem ser consultadas no texto História do Quilombo de Palmares.
A data de sua morte, descoberta por historiadores no início da década de 1970, motivou membros do Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial, em um congresso realizado em 1978, no contexto da Ditadura Militar Brasileira, a elegerem a figura de Zumbi como um símbolo da luta e resistência dos negros escravizados no Brasil, bem como da luta por direitos que seus descendentes reivindicam.
Com a redemocratização do Brasil e a promulgação da Constituição de 1988, vários segmentos da sociedade, inclusive os movimentos sociais, como o Movimento Negro, obtiveram maior espaço no âmbito das discussões e decisões políticas. A lei de preconceito de raça ou cor (nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989) e leis como a de cotas raciais, no âmbito da educação superior, e, especificamente na área da educação básica, a lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que instituiu a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-brasileira, são exemplos de legislações que preveem certa reparação aos danos sofridos pela população negra na história do Brasil.
A figura de Zumbi dos Palmares é especialmente reivindicada pelo movimento negro como símbolo de todas essas conquistas, tanto que a lei que instituiu o dia da Consciência Negra foi também fruto dessa reivindicação. O nome de Zumbi, inclusive, é sugerido nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana como personalidade a ser abordada nas aulas de ensino básico como exemplo da luta dos negros no Brasil. Essa sugestão orienta-se por uma das determinações da lei Nº 10.639, que diz no Art. 26-A, parágrafo 1º: “O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.”
A despeito da comemoração do Dia da Consciência Negra ser no dia da morte de Zumbi e do que essa figura histórica representa enquanto símbolo para movimentos sociais, como o Movimento Negro, há muita polêmica no âmbito acadêmico em torno da imagem de Zumbi e da própria história do Quilombo dos Palmares. As primeiras obras que abordaram esse acontecimento histórico, como as de Edison Carneiro (O Quilombo dos Palmares, Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 3a ed., 1966), de Eduardo Fonseca Jr. (Zumbi dos Palmares, A História do Brasil que não foi Contada. Rio de Janeiro: Soc. Yorubana Teológica de Cultura Afro-Brasileira, 1988) e de Décio Freitas (Palmares, a guerra dos escravos. Porto Alegre: Movimento, 1973), abriram caminho para a compreensão da história da fundação, apogeu e queda do Quilombo dos Palmares, mas, em certa medida, deram espaço para o uso político da figura de Zumbi, o que, segundo outros historiadores que revisaram esse acontecimento, pode ter sido prejudicial para a veracidade dos fatos.
Um dos principais historiadores que estudam e revisam a história do Quilombo dos Palmares atualmente é Flávio dos Santos Gomes, cuja principal obra é De olho em Zumbi dos Palmares: História, símbolos e memória social (São Paulo: Claro Enigma, 2011). Flávio Gomes procurou, nessa obra, realizar não apenas uma revisão dos fatos a partir do contato direto com as fontes do século XVI e XVII, mas também analisar o uso político da imagem de Zumbi. Segundo esse autor, o tio de Zumbi, Ganga Zumba, que chefiou o quilombo e, inclusive, firmou tratados de paz com as autoridades locais, acabou tendo sua imagem diminuída e pouco conhecida em razão da escolha ideológica de Zumbi como símbolo de luta dos negros.
Além dessa polêmica, há também o problema referente à própria estrutura e proposta de resistência dos quilombos no período colonial. Historiadores como José Murilo de Carvalho acentuam que grandes quilombos, como o de Palmares, não tinham o objetivo estrito de apartar-se completamente da sociedade escravocrata, tendo o próprio Quilombo dos Palmares participado do tráfico e do uso de escravos. Diz ele, na obra Cidadania no Brasil: “Os quilombos que sobreviviam mais tempo acabavam mantendo relações com a sociedade que os cercava, e esta sociedade era escravista. No próprio quilombo dos Palmares havia escravos”. (CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 48).
As polêmicas partem de indagações como: “Se Zumbi, que foi líder do Quilombo de Palmares, possuía escravos negros, a noção de luta por liberdade nesse contexto era bem específica e não pode colocá-lo como símbolo de resistência contra a escravidão”. A própria história da África e do tráfico negreiro transatlântico revela que grande parte dos escravos que a coroa portuguesa trazia para o Brasil Colônia era comprada dos próprios reinos africanos que capturavam membros de reinos ou tribos rivais e vendiam-nos aos europeus. Essa prática também ressoou, como atestam alguns historiadores, em dada medida, nos quilombos brasileiros.
Nesse sentido, a complexidade dos fatos históricos nem sempre pode adequar-se a anseios políticos. Os estudos históricos precisam dar conta dessa complexidade e fornecer elementos para compreender o passado e sua relação com o presente. Entretanto, esse processo precisa ser cuidadoso. O uso de datas comemorativas como marcos de memória suscita esse tipo de polêmica, que deve ser pensada e discutida criteriosamente, sem prejuízo nem das reivindicações sociais e, tampouco, da veracidade dos fatos.
* Créditos da imagem: Commons

Por Me. Cláudio Fernandes

sexta-feira, 23 de junho de 2017

15 heroínas negras que ganharam biografias em cordéis

15 heroínas negras do Brasil ganharam biografias em cordéis

Coletânea de cordéis de Jarid Arraes acaba de chegar às livrarias.

26/05/2017 18:15 -03 | Atualizado 30/05/2017 10:27 -03

Divulgação
"Acho curioso como sabemos todos os casos sexuais de tantos reis e imperadores, mas uma líder como Tereza de Benguela, que foi rainha do quilombo de Quariterê no Mato Grosso, nem sequer é mencionada nas escolas."
A observação acima é Jarid Arraes, autora de Heroínas Negras Brasileiras em 15 Cordéis, que acaba de chegar às livrarias. A obra da escritora de 26 anos busca justamente preencher essa lacuna na História oficial do Brasil - recuperando narrativas de mulheres negras que defenderam seus direitos e batalharam por seus espaços.
Em companhia do perfil de Tereza está a história de Maria Firmina dos Reis, responsável pelo primeiro romance abolicionista do Brasil, Úrsula, e fundadora da primeira escola mista do País - para meninos e meninas – projeto pelo qual foi duramente perseguida.


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Em entrevista ao HuffPost Brasil, Jarid aponta semelhanças na trajetória de Maria Firmina e de outra grande escritora negra brasileira, Maria Carolina de Jesus, cuja trajetória também é contada no livro.
"Embora tenha seu primeiro livro, Quarto de Despejo, publicado com muito sucesso, Carolina caiu no esquecimento porque ousou enfrentar a elite que a exotificava e peitou os supostos 'tutores' que não permitiam sua expressão artística em outras áreas, já que ela sonhava também em ser cantora", diz.
Heroínas Negras em 15 Cordéis apresenta ainda as histórias de princesas e rainhas africanas como Aqualtune, Zacimba Gaba e Na Agontimé, que foram sequestradas como escravas para o Brasil. "Mas elas lideraram revoltas, mantiveram quilombos de sucesso e não apenas lutaram pela liberdade de todos, como também deixaram importantes legados", conta.
O processo de pesquisa que resultou no livro começou há quatro anos, quando a jovem escritora se deparou com as trajetórias de três personagens negras também apagadas dos livros de História: Dandara dos Palmares, Luisa Mahin e Aqualtune.
"Durante toda a minha vida escolar e também na mídia, nunca tinha ouvido falar de sequer uma mulher negra que tenha feito algo de importante na história do Brasil, e quando tive acesso aos grandes atos dessas mulheres, mergulhei fundo para encontrar outras", diz.


Gabriela Pires
Encontrar detalhes sobre o curso das vidas dessas mulheres não foi fácil. Uma das maiores dificuldades que teve durante o processo foi levantar dados confiáveis sobre as heroínas - já que que existem poucos registros sobre essas figuras.
Filha e neta de cordelistas do Ceará e entusiasta da preservação da literatura de cordel, Jarid resolveu adaptar os enredos de vida das personagens que encontrou para o popular formato escrito em folhetos e, frequentemente, na forma rimada.
"Transformar essas biografias em cordel foi uma escolha de muito sucesso, porque o cordel tem uma linguagem acessível, divertida. É gostoso de compartilhar, de ler em grupo e é perfeito para utilizar em sala de aula", conta.
A coleção, que reúne 20 perfis, foi sucesso de vendas: mais de 20 mil cordéis em menos de dois anos. Hoje, os cordéis são usados em escolas de todo o Brasil e estão presentes até ma Biblioteca do Congresso de Washington, nos EUA,
A partir daí, tentar transformar a coleção em um livro se tornou o caminho perfeito para que as histórias alcançassem um público ainda maior.
O resultado final dessa empreitada é uma edição de 176 páginas publicado pela editora Pólen Livros - com 15 biografias contadas em cordel e prosa. A coletânea forma um "grupo representativo em diversidade", segundo a escritora.
"São mulheres de épocas diferentes, de estados diferentes e que lutaram batalhas diferentes. Entre escritoras, ativistas, líderes quilombolas e de revoltas contra a escravidão, escolhemos 15 heroínas negras que marcaram nossa história e nos deixaram um legado importantíssimo", explica.


Gabriela Pires

Feminismo e Ativismo Negro

Jarid Arraes teve uma trajetória ativa como blogueira antes de se dedicar totalmente à literatura.
Do primeiro blog autoral, Mulher Dialética, ela passou a escrever no Blogueiras Feministas, colaborando na sequência com o Blogueiras Negras. Na Revista Fórum, manteve a coluna Questão de Gênero, onde também escreveu matérias abordando temáticas ligadas a Direitos Humanos no geral.
Foi por causa dessa escrita política que passei a entender que eu poderia, sim, ser escritora de ficção, de poesia e de cordel, que esse lugar também era um lugar para mim. Com o tempo, e com os ataques que eu sofria pela internet, ameaças e xingamentos por tratar desses temas, eu decidi me dedicar exclusivamente a literatura.
Antes de Heroínas Negras em 15 Cordéis, ela lançou Lendas de Dandara, que apresenta em formato de prosa mítica o perfil de outra grande mulher negra da História do Brasil: Dandara dos Palmares - a esposa do líder Zumbi.


Divulgação
Questionada sobre o público-alvo de seu novo livro, Jarid afirma Heroínas Negras é necessário para toda a sociedade. E justifica:
"Porque não aprendemos sobre essas mulheres, não ouvimos falar das lutas que travaram, das conquistas que tiveram e que nos beneficiaram de modo geral, a todos. É também uma forma de combater mentalidades machistas e racistas, pois estamos tão habituados a vermos homens brancos como grandes conquistadores, desbravadores, intelectuais e escritores, que é quase como se nosso inconsciente coletivo pensasse que mulheres negras nunca fizeram contribuições do tipo para a humanidade."
Além dos livros, a escritora mantém projetos literários como o Clube de Escrita Para Mulheres – que, como o título denuncia, capacita mulheres para o mercado literário. São nessas vias que ela foca seu ativismo negro e feminista atualmente.
"Acredito que essas personagens e suas histórias produzem empatia, identificação, questionamento e fazem com que as pessoas entrem em contextos que poderiam não entrar de outra forma. Também aposto no poder coletivo de juntar mulheres que escrevem e questionam o machismo e o racismo do mercado editorial, dos eventos literários, assim produzimos muita mudança e afirmamos que as obras escritas por mulheres são relevantes, são de qualidade e que não vamos aceitar o 'mais do mesmo' que ainda domina esse mundo da literatura."