terça-feira, 28 de maio de 2013

Alguém falou de racismo?


Se caso não abrir a parte 2 veja no You Tube

PROJETO: RESPEITO À DIVERSIDADE NA ESCOLA

Projeto: Respeito à diversidade na escola

Objetivos
- Geral Estimular intervenções individuais e coletivas contra atitudes preconceituosas.
- Para a equipe diretiva e a coordenação pedagógica Criar condições necessárias para que as ações sejam realizadas.
- Para os professores Definir conteúdos, atividades e abordagens metodológicas que tratem a cultura negra de modo transdisciplinar.
- Para os alunos Compreender a diversidade étnico-racial e respeitá-la.
- Para os funcionários Participar de ações educativas que visam melhorar o comportamento de todos com relação à diversidade.
- Para os pais Colaborar com as ações propostas pela escola e, assim, desenvolver atitudes de respeito à diversidade étnica e racial.

Conteúdos de Gestão Escolar
- Administrativo Levantamento dos perfis dos alunos, elaboração de questionários, tabulação dos dados e organização de atividades.
- Comunidade Estímulo à reflexão sobre o tema.
- Aprendizagem Estudo da cultura afrobrasileira e das semelhanças e diferenças entre grupos étnicos existentes na escola. Elaboração de estratégias de combate à discriminação para a formação continuada dos professores.

Tempo estimado
Um ano.

Material necessário
Livros didáticos e de literatura, filmes, murais, sequências didáticas, caderno de anotações compartilhado entre todos, questionários de diagnóstico, acompanhamento e avaliação.

Desenvolvimento
1ª etapa Diagnóstico
Com base nas fichas de matrícula dos alunos e entrevistas iniciais feitas com os pais, prepare um levantamento do perfil dos alunos da escola. Reserve um horário de formação para apresentar aos professores esse material e leve também os relatos das atitudes preconceituosas observadas na escola sem dar nomes nem fazer julgamentos. Peça que todos respondam a um questionário com perguntas sobre a cultura negra e o modo como o racismo se manifesta. Todas as informações devem ser tabuladas e servirão de base para o planejamento pedagógico.

2ª etapa Participação dos funcionários 
Todos devem ser envolvidos no projeto desde o início. Marque uma reunião com os funcionários do serviço de apoio para falar sobre o trabalho que será desenvolvido na escola. Afirme que a participação deles é fundamental para que a escola se torne um lugar de respeito à diversidade. Peça que os diferentes grupos de funcionários escolham uma maneira de participar e elaborem uma ação pontual sobre o tema. No CMEB Mário Leal Silva, cada grupo ganhou um mural para desenvolver o trabalho. As merendeiras, por exemplo, preencheram o espaço com receitas africanas que passaram a preparar na cantina.

3ª etapa Envolvimento dos pais
As perguntas a respeito do racismo na escola devem ser feitas também aos pais para que eles relatem situações nas quais eles ou os filhos vivenciaram situações discriminatórias. Mande um questionário para que eles respondam em casa. Tabule os resultados e exponha-os em uma reunião do Conselho Escolar, onde todos podem debater o assunto e pensar em maneiras de evitar que atitudes preconceituosas voltem a ocorrer. Pelo menos duas vezes ao ano, promova um encontro de pais e peça que cada um traga elementos de sua cultura (como objetos de artesanato) para que sejam compartilhados com o grupo. Discuta a responsabilidade que todos têm na manutenção de um convívio sem preconceitos e exponha as ações que a escola desenvolve contra a discriminação.

4ª etapa Encontros de estudo
Com a análise dos diversos questionários que foram feitos, agende reuniões com a equipe pedagógica para discutir um plano de trabalho e elaborar propostas. No início, apresente um trecho de um filme que tenha alguma situação de preconceito. No CMEB Mário Leal Silva, a diretora, Mônica Louvem, apresentou O Triunfo, que trata da hostilização contra alunos pobres e negros e das ações de um professor para mudar isso. Debata as soluções encontradas pelo personagem. O obejtivo é fazer com que o grupo formule sugestões para serem colocadas em prática. Devem surgir algumas ideias, como eleger um dia da semana para o estudo de diferentes culturas - africana, europeia, oriental ou indígena - ou ainda promover momentos de leitura em conjunto com alunos e funcionários para a compreensão da diversidade étnica.

5ª etapa Definição de conteúdos disciplinares
Sob a orientação do coordenador pedagógico, os professores devem introduzir conteúdos ligados à cultura africana no planejamento das aulas, como a leitura de textos e a análise de pinturas e desenhos e a posterior produção (que pode ser exposta nos murais da escola). Outra sugestão é oferecer atividades pedagógicas no contraturno.

6ª etapa Documentação e acompanhamento
A equipe de gestão deve acompanhar de perto as atividades. Ao longo do projeto, os relatos de pais, funcionários e professores devem ser registrados em um caderno de anotações que será compartilhado entre todos. Os alunos podem documentar as medidas que consideram importantes para combater o preconceito. Sempre que houver manifestações de racismo, é importante fazer uma reunião com os envolvidos - sejam eles professores, pais, funcionários ou alunos. O diálogo entre as partes, com intermediacão de uma terceira pessoa, é a melhor solução para os problemas de discriminação.

Avaliação
As atitudes preconceituosas devem diminuir na escola. Ao fim de um período, toda a comunidade pode responder a um novo questionário: que contribuições o projeto está trazendo para o trabalho e o cotidiano? Que mudanças foram observadas? Quais atividades você considera de maior relevância? As respostas servirão de orientação para novas práticas.

EXEMPLO DE QUESTIONÁRIO PARA AVALIAR COMO SUA ESCOLA ABORDA O RACISMO

Exemplo de questionário para avaliar como sua escola aborda o racismo

Adaptadas do modelo da CMEB Mário Leal da Silva, as perguntas abaixo auxiliam você a fazer um diagnóstico, junto aos professores e à equipe, de como as questões raciais são tratadas na sua instituição

Assinale a alternativa que corresponde à realidade do seu ambiente escolar
1. A trajetória histórica do negro é estudada:
A- No Dia da Abolição da Escravatura, em agosto, mês do folclore, e no Dia da Consciência Negra.
B- Como conteúdo, nas várias áreas que possibilitam tratar o assunto.
C- Não é estudada.
2. Acredita-se que o racismo deve ser tratado:
A- Pedagogicamente pela escola.
B- Pelos movimentos sociais.
C- Quando acontecer algum caso evidente na escola.
3. A cultura negra é estudada:
A- Como parte do rico folclore do Brasil.
B- Como um instrumento da prática pedagógica.
C- Quando é assunto da mídia.
4. O currículo:
A- Baseia-se nas contribuições das culturas europeias representadas nos livros didáticos.
B- Constrói-se baseado em metodologia que trata positivamente a diversidade racial, visualizando e estudando as verdadeiras contribuições de todos os povos.
C- Procura apresentar aos alunos informações sobre os indígenas e negros brasileiros.
5. O professor:
A- Posiciona-se de forma neutra quanto às questões sociais. É o transmissor de conteúdos dos livros didáticos e manuais pedagógicos.
B- Reavalia sua prática refletindo sobre valores e conceitos que traz introjetados sobre o povo negro e sua cultura, repensando suas ações cotidianas.
C- Tem procurado investir em sua formação quanto às questões raciais.
6. O trato das questões raciais:
A- É feito de forma generalizada, pois a escola não tem possibilidade de incidir muito sobre ele.
B- É contextualizado na realidade do aluno, levando-o a fazer uma análise crítica dessa realidade, a fim de conhecê-la melhor, e comprometendo-se com sua transformação.
C- Não é considerado assunto para a escola.
7. As diferenças entre grupos etnoculturais:
A- Não são tratadas, pois podem levar a conflitos.
B- Servem como reflexão para rever posturas etnocêntricas e comparações hierarquizantes.
C- São mostradas como diversidade cultural brasileira.
8. As situações de desigualdade e discriminação presentes na sociedade são:
A- Pontos para reflexão para todos os alunos.
B- Pontos para reflexão para os alunos discriminados.
C- Instrumentos pedagógicos para a conscientização dos alunos quanto à luta contra todas as formas de injustiça social.
9. Acredita-se que, para fortalecer o relacionamento, a aceitação da diversidade étnica e o respeito, a escola deve:
A- Promover o orgulho ao pertencimento racial de seus alunos.
B- Procurar não dar atenção para as visões estereotipadas sobre o negro nos livros, nas produções e nos textos do material didático.
C- Promover maior conhecimento sobre as heranças culturais brasileiras.
10. Quanto à expressão verbal:
A- Acredita-se que a linguagem usada no cotidiano escolar tem o poder de influir nas questões de racismo e discriminação.
B- Usam-se eufemismos para se referir a etnia dos alunos, para não ofendê-los.
C- A linguagem não tem influência direta nas questões raciais.
11. Quanto ao trabalho escolar:
A- Alguns professores falam da questão racial em determinadas etapas do ano letivo.
B- Existe resistência dos professores para tratar a questão racial com relação à luta contra todas as formas de injustiça social.
C- Existe um trabalho coletivo sobre a questão racial com a participação de todos, inclusive da direção e dos funcionários.
12. Quanto à biblioteca:
A- Existem muitos e variados livros sobre a questão racial que contemplam alunos e professores.
B- Existem alguns tipos de livros (dois ou três) que contemplam a questão racial.
C- Não existem livros sobre o tema.
13. Quanto à capacidade dos professores sobre a questão racial:
A- Algumas vezes no ano fazemos cursos ou grupos de estudo sobre a questão racial.
B- Ainda não tivemos a oportunidade de estudar a questão.
C- Procuramos incorporar o assunto nas discussões de reuniões pedagógicas, grupos de estudo e momentos de formação.
14. No trato das questões de gênero:
A- A homossexualidade é percebida e discutida no espaço escolar.
B- Há um trabalho efetivo de combate à homossexualidade na escola.
C- Não se considera a homossexualidade um assunto a ser discutido na escola.
15. As discussões sobre a questão da mulher:
A- Não se discute com os alunos a história da discriminação das mulheres na sociedade.
B- A situação feminina é tratada em momentos pontuais, como no Dia Internacional da Mulher.
C- A questão da mulher é amplamente discutida e incorporada aos conteúdos curriculares.
16. Quanto à abordagem sobre populações indígenas:
A- A temática é tratada considerando as informações de livros didáticos e no Dia do Índio. B- Existe resistência dos professores para trabalhar criticamente essa temática.
C- A escola procura romper com os estereótipos que inferiorizam a cultura destes povos.

Gabarito
Gabarito do questionário sobre o racismo na sua escola

Resultado:
Até 06 pontos
1- Fase da individualidade
A questão racial ainda é tabu na escola, que se mantém silenciosa quando o assunto é discriminação. A diversidade étnica é desconsiderada, mesmo que tenha muitos alunos de diferentes origens em sua escola. Enquanto isso, as crianças perdem a oportunidade de formar valores essenciais para uma convivência harmônica em sociedade. Que pena.
De 07 a 18 pontos
2- Fase da negação
Embora a maioria dos professores negue a existência do racismo na sociedade e no ambiente escolar, o assunto começa a ser discutido na sua escola. No currículo, a cultura negra é considerada folclore e a história do povo negro não é exemplo de luta pela cidadania. Na tentativa de amenizar a situação, alguns professores apenas comentam a questão no Dia da Abolição da Escravatura e no Dia da Consciência Negra, não é mesmo?
De 19 a 24 pontos
3- Fase do reconhecimento
Muito bem! Sua escola está no caminho correto, pois reconhece a necessidade urgente de transformar o ambiente em um espaço de luta contra o racismo e a discriminação. Os alunos aprenderam conceitos sobre os diferentes grupos presentes na sociedade e a realidade de cada um é reconhecida e trabalhada. Continue a enfrentar esse belo desafio.
26 pontos ou mais
4- Fase do avanço
Parabéns! Sua escola progrediu bastante para construir-se verdadeiramente democrática. Visualiza com dignidade os diversos grupos étnicos e usa suas contribuições como ferramentas pedagógicas no trato da diversidade. Certamente, os alunos negros de sua escola têm a autoestima elevada e orgulho de sua origem. Todos os alunos reconhecem a necessidade de respeitar as diferenças e sabem que elas não significam superioridade nem inferioridade.

EDUCAÇÃO NÃO TEM COR

Educação não tem cor

Com discussões e projetos bem elaborados, é possível combater o preconceito racial que existe, sim, na escola. Está nas suas mãos, professor, o sucesso dessas crianças, negras e brancas, como alunas e cidadãs

A aluna Roseane queria ter os cabelos
trançados como os da colega Juliana:
ampliação dos padrões de beleza.
Foto: Ricardo B. Labastier/ Sorvo
Roseane Souza de Queirós, 8 anos, tem os cabelos lisos e claros, mas queria que eles fossem trançados e escuros como os da colega de sala de aula Juliana Francisca de Souza Claudino, uma garota negra também de 8 anos. Um dia, apareceu com o mesmo penteado afro. A atitude de Roseane surpreende. É muito, muito mais comum a criança negra desejar se parecer com a maioria dos heróis dos contos de fadas europeus, com as modelos estampadas em revistas e jornais e com os colegas que recebem maior atenção em sala, todos brancos e loiros. As duas meninas participam sistematicamente de discussões e projetos anti-racistas na Escola Classe 16, no Gama (DF). O desejo de Roseane é um exemplo concreto de que é possível combater na escola preconceitos e estereótipos enraizados.
E prova, de acordo com especialistas, que uma das saídas para o fim das desigualdades educacionais do Brasil está em enfrentar as desigualdades raciais que estão presentes, sim, no ambiente escolar. Quer ver como? A começar pelo currículo. A história e a cultura negras têm pouco ou nenhum destaque, diferentemente da cultura européia. Em um país com 44% de população afro-descendente, quantas pessoas conhecem a rainha Nzinga, líder da libertação do reino africano Ndongo em 1660, ou Dandara, guerreira do Quilombo dos Palmares, ao lado de Zumbi?

Outro dado: a participação das crianças negras na última série do Ensino Médio representa a metade da registrada na 4ª série. Já os brancos somam 44% dos alunos da 4ª série, mas totalizam 76% na 3ª série do Ensino Médio. Mais: a escolaridade média de um negro com 25 anos gira em torno de 6,1 anos. Um branco da mesma idade tem cerca de 8,4 anos de estudo. Dessa maneira, é possível concluir que crianças negras, como Juliana, enfrentam muitos obstáculos para permanecer na escola. E, sem dúvida, está nas mãos dos professores o futuro delas como alunas e cidadãs, defensoras de seus direitos.

Portanto, eis uma demanda urgente para você: ampliar a discussão e os projetos pedagógicos que privilegiem a igualdade racial. Desde maio, com a aprovação da Lei nº 10.639, é obrigatório o ensino de história da África e da cultura afro-brasileira em todas as escolas de Ensino Fundamental e Médio. Para ajudá-lo a se adequar, mostramos os principais erros e acertos sobre as questões raciais e projetos pedagógicos que valem como inspiração para trabalhar o assunto em novembro, mês de comemoração da consciência negra, e durante o ano todo.

Passado e presente de discriminação


Uma boa medida para entender o impacto do preconceito e da discriminação na vida escolar é analisar a biografia de professores negros. Quem é a professora de Juliana e Roseane, que conseguiu ampliar padrões de beleza na sala de aula?

Marizeth Ribeiro da Costa de Miranda, 39 anos, escolheu a profissão movida por suas experiências pessoais de racismo na escola e fora dela. Dois momentos são extremamente marcantes na trajetória de estudante de Marizeth: um passeio de coleira pelos corredores da escola (um colega quis reproduzir uma imagem de escravos mostrada no livro de História) e o tapa que levou de uma professora, quando conversava com uma colega branca na sala de aula. Somente Marizeth foi repreendida. "Precisei de muita força para não desistir dos estudos. Mas segui minha vida escolar calada", afirma.

O silêncio é uma constante nas relações raciais. De forma consciente, como fez Marizeth, ou inconsciente, como agem os que não sabem lidar com o assunto. Desse modo, tornou-se natural tratar a história do negro apenas na perspectiva da escravidão e aceitar padrões estéticos e culturais de uma suposta superioridade branca. Sobre isso, disse o líder negro americano Martin Luther King (1929-1968): "Temos de nos arrepender nessa geração não tanto pelas más ações das pessoas más, mas pelo silêncio assustador das pessoas boas".
O relato de vida de professores negros foi tema de um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais. As histórias que fazem parte da pesquisa se confundem em muitos pontos. Apelidos, xingamentos e discriminações são experiências vividas por todos os entrevistados. "Todos deixaram por algum período a escola, seja por problemas financeiros, seja por falta de motivação. As singularidades estão expressas na forma como cada um reagiu ao preconceito e à discriminação racial e nos processos pelos quais, gradativamente, chegaram a perceber a condição do negro no Brasil", conta Patrícia Santana, professora responsável pela pesquisa.
A cultura negra em sala de aula
ERROS

- Abordar a história dos negros a partir da escravidão.

- Apresentar o continente africano cheio de estereótipos, como o exotismo dos animais selvagens, a miséria e as doenças, como a aids.

- Pensar que o trabalho sobre a questão racial deve ser feito somente por professores negros para alunos negros.

- Acreditar no mito da democracia racial.
ACERTOS

- Aprofundar-se nas causas e consequências da dispersão dos africanos pelo mundo e abordar a história da África antes da escravidão.

- Enfocar as contribuições dos africanos para o desenvolvimento da humanidade e as figuras ilustres que se destacaram nas lutas em favor do povo negro.

- A questão racial é assunto de todos e deve ser conduzida para a reeducação das relações entre descendentes de africanos, de europeus e de outros povos.

- Reconhecer a existência do racismo no Brasil e a necessidade de valorização e respeito aos negros e à cultura africana.
 Na infância, parece que somos iguais

A história de Creuza Maria de Souza Yamamoto, professora da rede municipal de São Paulo, comprova os resultados da dissertação. Ela só se deu conta do racismo na vida adulta. "Na infância, parece que somos todos iguais e eu tentava me enxergar como meus colegas brancos. Mas minha cor era sempre motivo de piadas", lembra. Atenção e carinho dos professores não fazem parte das lembranças de Creuza. Ela ouviu mais de uma vez frases do tipo: "Ah... esses alunos são burros. Não dá para esperar muito deles". Adulta, optou pelo magistério e, na sala dos professores, o preconceito permanecia o mesmo. "No auge de uma discussão com uma colega, ouvi que meu lugar era na cozinha e não em sala de aula", conta. Creuza era a única professora negra da escola. Hoje, em outra escola, a primeira atividade que faz ao assumir uma turma nova é medir a intensidade do preconceito em seus alunos. Bonecas negras e brancas são colocadas no centro da sala de aula para chamar a atenção das crianças. "Infelizmente, quase sempre as bonecas negras são ignoradas, até mesmo pelos alunos negros."

Relação melhora com discussões

A escolarização significou para Marizeth, Creuza e os personagens ouvidos por Patrícia Santana uma possibilidade de ascensão social. E se tornar professor, além de ser um caminho para a melhoria de vida, foi uma escolha política. "Eu não quero que meus alunos negros sofram o tanto que eu sofri", afirma Marizeth. Assim, sempre que possível, elabora projetos pedagógicos e lança discussões sobre as relações raciais em sala de aula. O trabalho tem dado resultado. A relação entre os alunos negros e brancos está melhor e com a valorização da cultura negra, agora Juliana sabe que pode ficar bonita com suas tranças, diferentemente do que acontecia com a menina Marizeth. "E pensar que eu tinha a cabeça cheia de feridas por causa do creme que meu pai aplicava para alisar meus cabelos", lembra, emocionada. Esses exemplos valem uma reflexão: com quantas situações de preconceito e discriminação você depara todos os dias?

Lei institui valorização da África

Da geração das professoras Marizeth e Creuza à de Juliana e Roseane, os negros alcançaram importantes conquistas na educação. E somente agora há sinais concretos de mudanças para o futuro nas relações inter-raciais. Primeiro foram os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que orientam a promoção da igualdade em um dos temas transversais, Pluralidade Cultural. Mas um passo muito maior e mais significativo para o ensino foi dado com a Lei no 10.639. "A legislação rompe com a ordem dos currículos ao propor um novo conhecimento científico contrário à superioridade da produção cultural europeia", afirma Eliane Cavalleiro, pedagoga e coordenadora-geral de Diversidade e Inclusão Educacional do Ministério da Educacão (MEC). Ou seja, o mundo não se resume às conquistas e derrotas do continente europeu.

O documento determina que a história da África seja tratada em perspectiva positiva, não privilegiando somente as denúncias da miséria que atinge o continente. A importância dos anciãos na preservação da memória e a religiosidade, por exemplo, passam a fazer parte dos conteúdos, assim como o conhecimento da contribuição dos egípcios para o desenvolvimento da humanidade. As marcas da cultura de raiz africana devem ser ressaltadas particularmente em Artes, Literatura e História do Brasil. E mais. Os professores precisam valorizar a identidade negra e ser capacitados para destruir o mito da democracia racial no Brasil, criado durante o regime militar (1964-1985). "Quem estudou nas décadas de 1970 e 1980 aprendeu nos livros que o apartheid era um fenômeno de segregação racial restrito à África do Sul e que no Brasil não existia racismo. Não podemos mais acreditar nisso", afirma Cidinha da Silva, historiadora e presidente do Instituto da Mulher Negra (Geledés), de São Paulo.

Pesquisas e música afro 

A lei só sairá do papel se você tiver acesso a material e formação sobre a temática racial na educação. Portanto, agora é hora de buscar bibliografia sobre o assunto, eleger o tema para discussão em grupos de estudos e fomentar a criação de cursos em sua escola e cidade sobre educação anti-racista.

A Secretaria Municipal de Educação de São Paulo distribuiu 58 mil livros de literatura e de formação para a maioria das escolas da cidade. Foi lançado um kit com 40 títulos que valorizam a cultura e a identidade negra, como Menina do Laço de Fita, de Ana Maria Machado, e Felicidade Não Tem Cor, de Júlio Emílio Braz. O pacote inclui capacitação a 3 mil coordenadores das salas de leituras de escolas paulistanas. "Nossa opção de promover uma prática de igualdade racial parte de uma bibliografia. Esse é apenas um caminho", afirma Marilândia Frazão, assessora de assuntos de política pública e ações afirmativas da secretaria de Educacão de São Paulo.

Algumas cidades têm trabalhos na mesma linha e o resultado aparece nos projetos que começam a pipocar. O professor de História Eduardo Benedito Leite de Almeida, da Escola Municipal de Ensino Fundamental Dr. João Alves dos Santos, em Campinas (SP), explorou a pesquisa científica com turmas de 7ª série em um trabalho interdisciplinar. Entrevistas, questionários, leitura de livros, revistas e jornais, seminários, confecção de cartazes, desenhos, charges e histórias em quadrinhos ocuparam os alunos por todo o ano letivo. Os temas eram variados, mas todos ligados às relações inter-raciais. Um grupo de alunos pesquisou com moradores da comunidade ao redor da escola se existia racismo no Brasil, outro registrou tudo sobre as festas religiosas africanas e um terceiro conheceu manifestações folclóricas, como a congada.

Leitura e interpretação de indicadores sociais sobre a população negra foram feitas nas aulas de Matemática. Um dos objetivos do projeto era a produção de material de pesquisa. Assim, tudo era registrado em vídeo, fotografias ou artigos publicados no jornal da escola, como a oficina de maracatu. Nessa etapa, o professor contou com a participação de um grupo do movimento negro, que ensinou aos alunos a importância das batidas e dos significados desse ritmo africano. Uma das orientações da Lei nº 10.639 é contar com os membros do movimento negro para elaborar projetos pedagógicos. "O trabalho ainda não acabou, mas já é possível perceber mudanças significativas no tratamento entre os alunos e no interesse pelas coisas da África", conta Eduardo.

O projeto foi um dos vencedores do prêmio Educar para a Igualdade Racial, promovido pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), de São Paulo. Uma ótima fonte de experiências sobre combate ao racismo nas escolas. "O próximo passo é estabelecer indicadores de uma boa prática em classe. Ainda há disparidade entre o discurso de reconhecimento do racismo e as atividades pedagógicas", diz Isabel Aparecida dos Santos, assessora pedagógica do Ceert.

A identidade da criança negra

O trabalho de educação anti-racista deve começar cedo. Na Educação Infantil, o primeiro desafio é o entendimento da identidade. A criança negra precisa se ver como negra, aprender a respeitar a imagem que tem de si e ter modelos que confirmem essa expectativa. Por isso, deve ser cuidadosa a seleção de livros didáticos e de literatura que tenham famílias negras bem-sucedidas, por exemplo, e heróis e heroínas negras. Se a linguagem do corpo é especialmente destacada nas séries iniciais, por que não apresentar danças africanas, jogos como capoeira, e músicas, como samba e maracatu?

Em Artes, a professora Simone Marambaia Lins de Carvalho, da Escola Fundação Bradesco, no Rio de Janeiro, trabalhou máscaras africanas com turmas de 1ª série. Um dos eixos do projeto Ser Negro, sem Preconceito era desmitificar estereótipos da África. Os alunos pesquisaram curiosidades do continente africano até chegar à arte, como a cultura de Benim, na Nigéria, produtora de máscaras religiosas. Papelão, tinta e cola renderam modelos coloridos e divertidos para afastar os maus espíritos. Para a compreensão da realidade atual do negro no Brasil, a turma conheceu como era o cotidiano das crianças na época da escravidão, analisando imagens. As obras de Jean-Baptiste Debret (1768-1848), que foram comparadas às fotografias publicadas em jornais atuais, dão um panorama crítico da situação do passado e do presente. "Ainda há muito sofrimento e violência contra a criança negra, mas o contraponto do projeto estava na alegria e na majestade da cultura africana", explica a professora. Tudo como deve ser. Sem constrangimentos nem mitos equivocados.
Um histórico das lutas e conquistas recentes

A ciência dos séculos 18 e 19 considerava que os brancos possuíam maior capacidade intelectual. Depois vinham os índios e, por último, os negros. Alguns estudos afirmavam que os negros se situavam abaixo dos macacos. "Qualquer que seja o grau dos talentos dos negros, ele não é a medida dos seus direitos", Thomas Jefferson (1743-1826), político americano.

1948 - Uma das mais significativas experiências de mobilização negra foi o jornal Quilombo, editado no Rio de Janeiro. A edição nº 0, ano 1, trazia a seguinte afirmação: "Nos dias de hoje a pressão contra a educação do negro afroxou (sic) consideravelmente, mas convenhamos que ainda se acha muito longe do ideal".

1949 - 1º Congresso do Negro Brasileiro. Temas abordados: sobrevivências religiosas e folclóricas; formas de luta (capoeira de Angola, batuque, pernada); línguas (nagô, gegê, língua de Angola e do Congo, as línguas faladas nos anos de escravidão).

Década de 1950 - Iniciam-se os primeiros estudos sobre preconceitos e estereótipos raciais em livros didáticos no Brasil.

Décadas de 1960 e 1970 - Os militares oficializaram a ideologia da democracia racial e a militância que ousou desafiar esse mito foi acusada de imitadora dos ativistas americanos, que lutavam pelos direitos civis. O mito da democracia racial persiste até hoje.

Década de 1980 - Retomada dos estudos sobre preconceitos e estereótipos raciais em livros didáticos. Os resultados das pesquisas apresentam a depreciação de personagens negros, associada a uma valorização dos brancos.

1984 - Em São Paulo, a Comissão de Educação do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra e o Grupo de Trabalho para Assuntos Afro-Brasileiros promoveu discussões com professores de várias áreas sobre a necessidade de rever o currículo e introduzir conteúdos não discriminatórios.

1985 - A comemoração de 13 de maio foi questionada pela Comissão por meio de cartazes enviados às escolas do estado de São Paulo. O material também exaltava 20 de novembro como data a comemorar a consciência negra.

1986 - A Bahia inseriu a disciplina Introdução aos Estudos Africanos nos cursos de Ensino Fundamental e Médio de algumas escolas estaduais atendendo a antiga reivindicação do movimento negro.

1996 - Entre os critérios de avaliação dos livros didáticos comprados e distribuídos pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) foram incluídos aqueles específicos sobre questões raciais.

1998 - Inclusão da Pluralidade Cultural entre os temas transversais nos Parâmetros Curriculares Nacionais.

2003 - A publicação da Lei no10.639 tornou obrigatório o ensino da História da África e dos Afro-brasileiros no Ensino Fundamental e Médio.

Fonte: estudos e pesquisas de Benilda Regina Paiva de Brito e Fúlvia Rosemberg
Quer saber mais?
Contatos
Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), R. Duarte de Azevedo, 737, 02036-022, São Paulo, SP, tel. (11) 6978-8333, internet: www.ceert.org.br

Escola Classe 16, Q 06 área especial, setor Sul, 72415-060, Gama, DF, tel. (61)556-2553

Escola Municipal de Ensino Fundamental Dr. João Alves dos Santos, Estr. dos Amarais, 635, 13067-170, Campinas, SP, tel. (19) 3281-2694

Fundação Bradesco, R. Haddock Lobo, 253, 20260-131, Rio de Janeiro, RJ, tel. (21) 2503-1664

Bibliografia
Almanaque Pedagógico Afrobrasileiro
, Rosa Margarida de Carvalho Rocha, 167 págs., Ed. Mazza, tel. (31) 3481-0591, 29 reais

segunda-feira, 27 de maio de 2013

A História, o africano e o afro-brasileiro

Publicado em 01/06/2012
O programa, da disciplina Conteúdos e Didática da História do Curso de Pedagogia Unesp/Univesp, discute de que maneira os africanos são retratados pela História da civilização. Concomitantemente, "A história, o africano e o afro-brasileiro" mostra como a lei 10.639, que torna obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira em todas as escolas brasileiras, tem contribuído para o deslocamento da perspectiva histórica africana, tradicionalmente centrada na Europa.

Educação Infantil e a Construção de uma Educação Antirracista: desafios e proposições


Educação infantil  e diversidade
Educação infantil e a construção de uma educa-
ção antirracista: desafios e proposições
Lucimar Rosa Dias 1 
1 Mestre em Educação pela UFMS. Doutoranda no Programa de Pós-graduação em Educação da USP. 
Consultora do CEERT.
1. Quem Deve Ensinar, o Que
Deve Ser Ensinado e onde
Ensinar?
Pesquisas cada vez mais avançadas nas á-
reas médicas, educacionais e também da 
psicologia indicam que a fase inicial da vida 
de um ser humano tem muita importância. 
Desde a concepção até os seis anos, as coisas que vivemos, sentimos, expressamos e 
aprendemos podem produzir marcas que 
ficarão presentes ao longo de nossas vidas, 
nos ajudando a viver melhor ou impedindo 
que isso aconteça. Além disso, é uma fase na 
qual se aprende rapidamente e em grande 
quantidade. 
Estas descobertas “criaram” fazeres educativos nos quais está presente a certeza de que 
a criança pequena é uma pessoa ativa, que 
constrói suas próprias opiniões, que sabe 
manifestar seus sentimentos, suas dúvidas, 
seus desejos, sonhos e fantasias. Estamos 
cada vez mais preocupados em organizar lugares nos quais a criança possa de fato constituir-se como sujeito atuante, participativo 
e crítico. Acreditamos que as crianças que 
tenham acesso a esse tipo de ambiente crescerão de um modo melhor, com chances de 
serem respeitadoras das diferenças entre as 
pessoas, mais educadas, criativas, honestas, 
preocupadas com a coletividade, com maior 
capacidade de resolver os problemas sociais, 
políticos e econômicos, enfim, uma criança 
que viva sua infância de modo seguro e que 
cresça sendo cidadã, ciente de seus direitos 
e deveres.
Toda essa expectativa gerada pelo conhecimento sobre o desenvolvimento do ser humano passou a influenciar as ações desenvolvidas por quem educa e trouxe a certeza 
de que essa educação não é para criar o cidadão do futuro, mas sim do presente. Quando 
pensamos na atual sociedade, as expectativas aqui levantadas parecem meras utopias, 
e o são, mas no sentido que Paulo Freire dá 
ao termo, isto é, em Paulo Freire, a realidade 18
projetada (utopia) funciona como um dínamo de seu pensamento, agindo diretamente 
sobre a práxis. Portanto, não há nele uma 
teoria separada da prática. Estamos buscando, na ação e na reflexão, transformar 
a nossa realidade para algo melhor e assim 
buscamos a nossa utopia de um mundo melhor fazendo-a acontecer a cada dia.
A vida está repleta de momentos em que 
educamos e em todos eles é possível perceber a tentativa de aplicação de um modo 
educativo que esteja em consonância com 
essas descobertas. Os pais, independentemente da classe social em que se situam, 
tentam dialogar mais com seus filhos, nos 
lugares que desenvolvem a educação informal, isto é, sempre há tentativas de ser 
mais atrativo, explicar mais o que se quer, 
trabalhar mais com a sedução do que com a 
obrigação. Um exemplo disso é o que ocorre nos grupos religiosos, que cada vez mais 
têm trabalhos voltados especificamente 
para as crianças pequenas usando linguagem apropriada – desenhos, histórias e até 
brinquedos – para informar suas crenças. 
Essas mudanças nos modos de educar são 
perceptíveis também na educação formal, 
ainda que haja a aceitação, por parte de 
alguns educadores, da premissa de que a 
escola não consegue mais “competir” com 
os meios contemporâneos de transmissão 
de informações, de valores e de atitudes: 
revistas, jornais, internet (para algumas) e 
principalmente pela televisão. Ao mesmo 
tempo, convive-se com outra premissa, a de 
que muitas coisas que antes se aprendiam 
no espaço doméstico, hoje se aprendem 
na escola. Estas situações parecem contraditórias e, por isso, produzem nos educadores uma sensação de barco à deriva. Na 
realidade, uma situação não exclui a outra, 
convive-se cada vez mais com informações 
que chegam à escola por meio de diferentes 
recursos, todavia, o papel do educador, que 
é ensinar, continua de pé. 
Atualmente, a função do educador, mais 
que transmitir informações, é transmitir 
conhecimento, ou seja, junto com seus alunos proceder à “leitura de mundo”, refletir, 
filtrar os conteúdos é de suma importância. Os alunos recorrem ao educador para 
compreender, discutir e comentar as informações adquiridas, transformando-as em 
conhecimento. 
É claro que não excluímos a possibilidade de 
que as crianças também tragam para seus 
professores conhecimentos, mas isso acontece desde antes de a televisão e de a internet adentrarem ao espaço da escola. Desde 
sempre, temos alunos que investigam, são 
curiosos, elaboram questões e nos propõem 
pensar juntos, construindo um fazer pedagógico colaborativo e solidário. Se acontece 
assim quando tratamos da educação em geral, imaginem a dimensão desses questionamentos quando nos referimos à educação 19
infantil, período de vida em que o sujeito 
está aprendendo quase tudo: seu nome, 
falar, andar, diferenciar letras de números, 
palavras de desenhos, questiona-se sobre 
quase tudo: Por que chove? Por que sou 
menino? Por que sou menina? De onde vêm 
os bebês? Onde vivem as formigas? São 
tantas as questões e tão inusitadas que os 
educadores se veem muitas vezes atônitos, 
no entanto, quando 
conseguem concretizar o seu currículo 
a partir das questões 
apresentadas pelas 
crianças, percebem 
que a riqueza e o 
grau de aprendizagem vão muito além 
do que a formalidade dos currículos 
previstos.
Nesse universo de questões inclui-se o tema 
do respeito às diferenças raciais. As crian-
ças se perguntam: Por que temos cores diferentes? Por que sou branca e ele é negro? 
Por que meu cabelo é crespo e o dele é liso? 
Durante esses questionamentos, um educador atento percebe as manifestações de 
rejeição às diferenças e tem por obrigação 
pedagógica trabalhar com elas, construindo com as crianças o princípio de que as 
diferenças entre os seres humanos são um 
valor e não devem ser utilizadas para inferiorizar as pessoas. Como sabemos, nesse 
processo de descoberta, questionamento 
e manifestações, as crianças negras estão 
em desvantagem; criadas numa sociedade 
racista e discriminadora, as crianças brancas, desde muito cedo, percebem-se portadoras dos bens simbólicos e materiais que a 
branquitude lhes dá neste país. E as crian-
ças negras também percebem que o fato de 
serem negras lhes traz desvantagens. Com 
isso, estabelece-se 
sempre uma rela-
ção desigual entre 
as crianças, quase 
sempre conflituosa 
e, infelizmente, não 
são todos os educadores que percebem que esse é um 
tema do universo 
infantil que precisa 
ser contemplado na organização dos conteúdos a serem trabalhados ao longo do 
ano. Por isso, foi necessário instituir a Lei 
n. 10.639/03, que obriga as escolas públicas 
e privadas a incluir no currículo a história e 
cultura afro-brasileira e africana.
Já existem muitas experiências de inclusão 
no currículo desse tema. Ele tem recebido 
diferentes denominações: respeito às diferenças raciais, tolerância, trabalho com a 
diversidade, diversidade étnico-racial, pluralidade cultural, promoção da igualdade 
racial etc. Sem aprofundarmos na questão 
da denominação, que é importante, mas 
As crianças se perguntam: 
Por que temos cores 
diferentes? Por que sou 
branca e ele é negro? Por 
que meu cabelo é crespo e 
o dele é liso? 20
não será foco de nossa reflexão, o fundamental é sabermos que a escola está sendo 
chamada a incluir no seu currículo um trabalho pedagógico com o tema da educação 
das relações étnico-raciais, seja por meio da 
legislação, como é o caso do cumprimento 
da Lei n. 10.639/03, seja porque nossa realidade indica que desde muito cedo os educandos precisam aprender a conviver com 
o outro, respeitando-o em seu jeito de ser 
física e psicologicamente, respeitando o seu 
modo de estar no mundo com suas crenças, 
desejos e ideias e com seu modo de fazer, 
isto é, sua cultura, seu jeito de produzir e 
reproduzir a vida. 
Tal respeito, obviamente, não significa passividade diante do outro, ausência de conflitos e discussões sobre pontos de vistas. 
Não estamos advogando que respeitar significa deixar que o outro faça o que quiser, do 
jeito que quiser. O respeito é sempre a negociação entre os diferentes modos de ser, 
estar e fazer. Isso inclui a possibilidade de 
pensar juntos e também de tentar convencer o outro sobre determinadas coisas, mas, 
sobretudo, implica não querer exterminar 
o outro, nem odiá-lo. Ignorar a sua origem, 
impedir que conheça a produção dos seus 
antecedentes, ou dificultar que os sujeitos 
gostem de si mesmos, a exemplo do que tem 
sido feito com as crianças negras brasileiras. 
Precisamos incluir como papel fundamental da escola problematizar o racismo, que 
mata o que de mais belo os sujeitos têm, 
qual seja, a capacidade de amar o outro com 
suas singularidades. Isto é, aprender a viver 
e a conviver com quem é diferente de mim. 
Ensinar isso é tarefa que cabe aos familiares, 
mas também aos educadores, principalmente, educadores de crianças pequenas.
2. oENSiNo-APrENDizAGEm 
SobrE o rESPEiTo àS
DifErENÇAS rAciAiS NA
EDucAÇÃo iNfANTiL
No Brasil, a Educação Infantil, desde 1996 
(LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação 
– n. 9.394/96), passou a ser um direito da 
criança, independentemente de sua condi-
ção social. Todos os meninos e meninas de 
0 a 6 anos devem ter garantido o seu direito 
ao acesso à educação básica. 
Vitórias assim, mesmo que ainda longe de 
serem concretizadas, surgem a partir das 
constatações de que os seres humanos precisam de amparo, principalmente no come-
ço de suas vidas, pois é nele que se originam 
as bases da aprendizagem, sobre os valores, 
atitudes e também sobre a sua identidade e 
a identidade do outro. Quem sou eu? Quem 
é ele/ela? Por que ele/ela é diferente de mim? 
Como a construção da identidade é sempre uma relação com o outro, as crianças 
fazem perguntas sobre as diferenças entre 
as pessoas e constroem suas percepções de 
superioridade, inferioridade, igualdade e desigualdade.21
Meninos e meninas dessa faixa etária, como 
já dissemos, devem ser considerados sujeitos de direitos e portadores da capacidade 
humana de pensar sobre a vida nos mais 
diferentes aspectos. Eles fazem perguntas 
sobre si mesmos, sobre a natureza, sobre a 
vida, e também formulam respostas sobre 
esses mesmos temas a partir do que veem, 
ouvem e sentem ao 
seu redor.
É a partir da concep-
ção de criança capaz 
de refletir sobre o seu 
dia a dia, de questionar e problematizar 
as diferentes informações recebidas pelos diversos meios a 
que têm acesso que 
tratarei o tema da 
educação infantil: desafios e proposições 
para a construção de espaços educativos de 
respeito às diferenças raciais e do processo 
de construção de uma educação antirracista 
na educação infantil. 
É certo que a vida nas cidades leva as crian-
ças a entrarem cada vez mais cedo para 
as escolas. Por diferentes motivos, alguns 
porque os familiares precisam trabalhar, 
ou porque os pais sentem a necessidade de 
procurar companheiros para os filhos, ou 
por outros motivos. O fato é que as crian-
ças chegam hoje às escolas com 06 meses de 
vida e passam de 4 a 6 horas nesses espaços 
educativos. 
Em alguns casos, é a educadora que ouve a 
primeira palavra dita pela criança, vê o primeiro passo, ajuda a tirar a fralda, ensina a 
comer, e até conhece melhor os amigos da 
criança do que os próprios pais, porque é ela 
quem passa com 
ela longas horas. 
Sendo assim, as 
educadoras terão 
uma função importante na constitui-
ção da identidade 
dessas crianças. 
Pois é também nessa faixa etária que 
a criança se pergunta e pergunta 
aos outros sobre as 
diferenças sexuais, de classe e de cor/raça. 
Uma educadora, para ser considerada comprometida com uma educação séria, de qualidade, democrática e antirracista, tem que 
estar atenta ao processo de construção da 
identidade das crianças. É na interação social, entre as crianças e seus pares e entre 
as crianças e os adultos, que esse processo 
vai sendo construído. Na escola, ele é mediado pela educadora que tem a responsabilidade de proporcionar momentos nos quais 
as referências positivas relativas a todos os 
grupos humanos estejam presentes, possibiUma educadora, para ser 
considerada comprometida 
com uma educação séria, 
de qualidade, democrática 
e antirracista, tem que 
estar atenta ao processo de 
construção da identidade 
das crianças.22
litando que as crianças aprendam a importância da diversidade.
Não podemos considerar que uma educadora seja comprometida quando silencia diante do sofrimento de uma criança que não é 
aceita pelo grupo por algum tipo de marca, 
por ser negra, ou gorda, ou usar óculos ou 
por outro motivo qualquer. Temos visto, por 
meio de várias pesquisas, que entre as muitas marcas que são objetos de discrimina-
ção e preconceito, portanto de dor, a mais 
forte e marcante é de ser negra, ter cabelos 
crespos. Crianças da mais tenra idade, devido às suas heranças de origem racial (cor e 
cabelo), são expostas à convivência hostil e 
à ironia de colegas e, em muitos casos, dos 
próprios educadores (o que é mais grave). 
Isso de fato se constitui em crime contra 
as crianças negras, pois sabemos que, para 
desenvolver-se de modo positivo, a criança 
depende de um suporte psicossocial. Isso 
significa, entre outras coisas, trazer para escola conteúdos que foram por muito tempo negados como pedagógicos, tais como o 
conhecimento da cultura de outros povos 
que não os europeus. A história dos negros 
brasileiros e do continente africano, assim 
como a dos indígenas, em geral são desvalorizadas. Podemos e devemos diversificar 
as referências de nossas crianças sobre as 
populações existentes. Elas precisam saber 
que os povos negros e indígenas possuem 
uma história de luta e resistência, possuem 
cultura, criam histórias, músicas, etc. Isto 
vai possibilitar que as crianças aprendam 
sobre si mesmas, pois falar dos povos africanos e compreender a história de todos os 
brasileiros são atitudes que também contribuem para a construção de novos olhares 
desses grupos para si mesmos e de outros 
grupos para com eles.
Reivindicamos que é necessário abordar na 
educação infantil aspectos que tratem das 
relações raciais porque as marcas raciais - 
cor, cabelo, aspectos culturais - são elementos presentes no cotidiano das crianças nesta faixa etária, suscitando-lhes curiosidades 
e conflitos que não podem ser desconsiderados. Muitas vezes, a educadora percebe 
prontamente esses conflitos e curiosidades, 
e age sobre eles. Outras vezes, cala-se por 
medo de tocar num assunto que a sociedade 
brasileira quis esconder, sentindo-se despreparada para abordá-lo.
O silêncio, nesse caso, é mais que uma omissão, é um crime contra a humanidade. Calar-se é negar sua contribuição para que as 
crianças sejam capazes de compreender o 
mundo que as cerca e dar-lhes referenciais 
para que não sejam racistas, preconceituosos, sexistas. É preciso oportunizar-lhes outros modos de ver as pessoas que as cercam, 
possibilitando-lhes questionar as informa-
ções que recebem nos diferentes ambientes 
em que convivem.
Os marcos legais para trabalharmos questões relativas à construção da identidade, 23
de modo que consideremos os aspectos raciais como importantes, já existem desde 
1998, quando foram lançados os Referenciais Curriculares da Educação Infantil. Este 
documento recomenda que:
O desenvolvimento da identidade e da 
autonomia estão intimamente relacionados com os processos de socialização. 
Nas interações sociais se dá a ampliação 
dos laços afetivos que as crianças podem estabelecer com as outras crianças 
e com os adultos, contribuindo para que 
o reconhecimento do outro e a constatação das diferenças entre as pessoas 
sejam valorizados e aproveitados para o 
enriquecimento de si próprias.
 Atualmente, temos as Diretrizes Curriculares 
Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana - DEER, advindas 
da Lei n. 10.639/03, que legitimam os trabalhos que abordam este tema em qualquer 
etapa da educação básica. Apesar desses 
marcos, sabemos que a inclusão, na prática 
da educadora, de ações voltadas para esse 
aspecto virá da certeza dela de que elas são 
importantes. O convencimento das educadoras de que essa é uma questão pertinente, 
que faz parte do seu dia a dia e que precisa 
ser pedagogicamente abordada, fará com 
que esses marcos legais criem vida e garantam às nossas crianças de todas as origens 
étnico-raciais uma educação que promova a 
convivência entre os pares, desconstruindo 
a percepção da desigualdade. Muitas experiências por todo o Brasil já estão sendo realizadas e pretendemos colaborar para que 
inúmeras outras sejam concretizadas.
3. A PErcEPÇÃo DA iGuALDADE
NADifErENÇA
Sabemos que a educação, enquanto processo, não pode eliminar as desigualdades que 
têm por base estrutural a economia, mas temos certeza de que ela pode colaborar na 
construção do que chamamos de percepção 
da igualdade entre os seres humanos. Como 
disse Paulo Freire: “Se a educação sozinha 
não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda.” Vivemos numa 
sociedade que construiu a idéia de igualdade 
formal “todos são iguais perante a lei”, sem 
muitas preocupações com a concretização 
dessa igualdade. Por isso, é possível conviver 
com essa idéia e, ao mesmo tempo, na vida 
cotidiana, ver pessoas serem inferiorizadas 
pelas marcas que trazem em seu corpo ou 
no modo como vivem e não nos incomodarmos muito, afinal, “todos são iguais perante 
a lei”. 
Por isso, cremos que seja papel fundamental da educação como um todo e da educa-
ção infantil em particular possibilitar que 
as crianças compreendam e percebam que 
o ambiente escolar é igualitário na sua concretude, exatamente, porque respeita e dis-24
cute as diferenças. Para isso, não adiantará 
muito as educadoras usarem algumas frases 
de efeito muito comuns no meio educacional: “para mim as crianças são iguais”, “eu 
trato todos do mesmo jeito”, “aqui na sala 
não tem diferença de cor” ou “eu nem percebo a cor dos meus alunos”, “eu não presto atenção se tem preto ou branco na sala”. 
Todas essas falas estão imbuídas do princí-
pio da democracia, 
mas no sentido em 
que Maclaren (2002) 
critica. Segundo ele, 
“Uma das perversões 
sub-reptícias da democracia tem sido 
a maneira pela qual 
os cidadãos têm sido 
convidados a se esvaziarem de toda a sua 
identidade racial e étnica, de forma que, 
aparentemente, eles se apresentam nus 
diante da lei” (2000, p. 42).
A atitude expressa nessas frases está longe de 
ser a da educadora comprometida com uma 
educação igualitária, pelo contrário, quando 
não “vemos” as diferenças raciais presentes nas salas de aulas da educação infantil, 
estamos colaborando para que as crianças 
que passam por nós mantenham as ideias 
de percepção da desigualdade de modo forte e inabalado. O velho ditado “quem cala 
consente” é muito verdadeiro neste caso. 
Calarmos diante das questões que as rela-
ções raciais suscitam entre as crianças é 
colaborar para que as crianças negras cres-
çam tímidas, temerosas, envergonhadas de 
si mesmas, e sintam que a escola não é uma 
ambiente que as acolhe, já que nega sua história e cultura e não as protege da violência 
da discriminação e do preconceito raciais. E 
colabora também para que as crianças brancas cresçam acreditando na superioridade 
que a brancura lhes dá, sentindo-se bonitas, 
inteligentes, seguras.
Cabe às educadoras 
fazerem a sua parte 
no que diz respeito a 
desconstruir a ideia 
de que um grupo de 
pessoas é melhor que 
outro. É preciso desconstruir essa percepção de desigualdade legitimada, assegurada, permitida, camuflada 
na ideia abstrata de igualdade. Precisamos 
estabelecer percepções de igualdade, e isso 
só ocorrerá se provocarmos uma ruptura no 
que está estabelecido. 
3.1. como fAzEr? 
Uma criança, desde bebê, na convivência, 
percebe quem é mais bem aceito pelos 
adultos. Não é difícil para elas reconhecerem quem recebe mais carinho, mais beijos, 
mais abraços. Elas observam quais fotos são 
mais expostas, se os lugares destinados a 
determinada criança são ou não privilegiados. Todas as crianças – brancas, negras ou 
Uma criança, desde bebê, 
na convivência, percebe 
quem é mais bem aceito 
pelos adultos.25
indígenas – são capazes de perceber a desigualdade instalada nos ambientes, quando 
essa existir. Mesmo que ainda não consigam 
verbalizar isso, elas percebem. Por vezes, há 
educadoras que sustentam essa desigualdade sem nela atentar. Nas instituições de 
educação infantil há sempre imagens de bebês, fotos, gente disposta a pegar no colo e 
dar carinho. Será que todas as crianças, de 
todos os grupos raciais, são objetos desses 
carinhos? Às vezes, as educadoras repetem 
formas interativas preconceituosas e discriminatórias, noutros casos percebem o racismo nessas relações, mas se calam.
Tanto o silenciamento quanto o desconhecimento tornam-se procedimentos desumanizadores, porque reproduzem e mantêm 
situações dolorosas vividas por pessoazinhas
tão pequenas. Recorro a um exemplo, que 
me foi relatado por uma professora, para 
demonstrar como ocorrem situações de rejeição/aceitação presentes o tempo inteiro 
nas salas de aula da educação infantil e nem 
sempre a professora está atenta.
Embora seja educação infantil a gente 
acha que não existe preconceito, mas 
existe. Não que a criança em si seja 
preconceituosa, ela... ela... ela reproduz as atitudes dos adultos... Então, 
era assim, às vezes na hora da roda, 
“ciranda, cirandinha”, “atirei o pau 
no gato”, tinha criança branca que 
não aceitava pegar na mão de crian-
ça negra. Isso com 1[ano], 2 [anos] lá 
no berçário, você não sabe o porquê. 
parece que as criança negras ou escurinhas sentem dificuldades de ser aceitas. Como também tem criança que 
se apega demais a outra. Uma crian-
ça negra, por exemplo, você vê muito assim, uma criança negra se apega muito à criança de pele clara, eu 
acho, não sei se é porque chama muito 
a atenção dela, então, tinha criança 
que não aceitava... 
As educadoras têm diante dessa realidade 
uma função importante que é proporcionar 
às crianças o que estou chamando de percepção da igualdade, isto é, a partir das atividades realizadas no seu fazer pedagógico, a 
educadora possibilitará que as crianças percebam que não há cor de pele bonita, não 
há apenas um tipo de cabelo que é “bom”. 
Todos os cabelos têm sua beleza, vantagens 
e desvantagens. Enfim, o ambiente escolar 
deve fornecer informações explícitas e implícitas que todos os tipos raciais têm valor. 
Vale a pena destacar algumas características 
das crianças nessa faixa etária e, por conseguinte apontar alguns caminhos metodológicos para o trabalho com as diferenças 
raciais na educação infantil.26
4. ProPoSiÇõES PArA A
coNSTruÇÃo DE ESPAÇoS
EDucATivoSQuE PromovAm A
PErcEPÇÃo DE iGuALDADE NA
DifErENÇA
4.1. Por oNDE ir? “o cAmiNho 
SE fAz Ao cAmiNhAr”
Devemos ficar bem atentas para que o trabalho com essa temática parta de questões 
que motivem as crianças e, sempre que possível, ele seja incluído em temas já consolidados no currículo da educação infantil. Ao 
apresentar dicas de como incluir esse trabalho no cotidiano da escola, implica esclarecer que a construção da percepção da igualdade racial necessita do compromisso das 
educadoras em assumir o princípio de que 
a diferença é um valor. Isso quer dizer que é 
necessário construir metodologias, atividades, material didático para proporcionar o 
entendimento desse princípio. Mais do que 
debater com nossos pequenos a impertinência do racismo, devemos construir com eles 
ideias positivas sobre os diferentes povos. A 
partida para uma educação antirracista na 
educação infantil não é o discurso moralizante de “como é feio ser racista ou preconceituoso” ou de como “não devemos discriminar o amiguinho, pois todos são filhos de 
Deus”. Essas falas são muito comuns entre 
as educadoras desejosas de ensinar uma 
postura mais adequada aos seus alunos em 
situações conflitantes. São bem intencionadas, porém, produzem pouco efeito na construção da percepção de igualdade. 
Essa percepção deve fundamentar-se no 
princípio de que as pessoas são portadoras 
dos mesmos direitos de serem amadas, cuidadas, ensinadas, respeitadas e educadas. 
Podemos partir de trabalhos organizados 
em projetos com objetivos pedagógicos, os 
quais tragam informações positivas sobre o 
povo negro e indígena, preferencialmente, 
ou sobre qualquer outro grupo que possa 
ser estudado.
Não sabemos todas as estratégias de como 
abordar os temas relativos aos modos de 
combater o racismo em sala de aula e obter resultados positivos. O tema não é novo, 
mas a busca por sua instituição na escola é, 
e por isso há muitas dúvidas e incertezas, 
porém, não existe outra forma de descobrir 
as melhores estratégias, sem ser o exercício 
do fazer pedagógico, ato que implica açãoreflexão-ação. Nosso grande mestre Paulo 
Freire disse “no momento, porém, em que 
se comece a autêntica luta para criar a situação que nascerá da superação da velha, já 
se está lutando pelo ser mais”(1987, p. 34). É 
nesse sentido freiriano que na própria ação 
da educadora vai se desenhando o melhor 
caminho a ser seguido. 
Apresentaremos algumas sugestões baseadas nos conteúdos previstos nos Referenciais Curriculares Nacionais da Educação 27
Infantil, na nossa experiência como educadora antirracista e na experiência de outras 
professoras que foram conosco compartilhadas nessas muitas andanças que temos 
feito pelo Brasil. Entretanto, longe de ser 
um modelo estático a ser seguido, são possibilidades que devem ser apropriadas pelas 
educadoras e ressignificadas, considerando 
a idade de suas crianças, o grau de reflexão, 
as condições objetivas que os gestores proporcionam, e é claro, o acúmulo que cada 
educadora vai adquirindo ao longo do fazer. 
Essa tarefa pode ser no início árdua, mas 
à medida que as educadoras a exercitam, 
elas compreendem a grandeza nela contida 
e vão-se realizando ações que concretizam 
os princípios apresentados. Dessa forma, 
transformam-se em atividades prazerosas e 
alentadoras, fazendo de cada educador antirracista um cidadão ético e feliz, por cumprir com seu dever de educar.
4.2. o bANho, A TrocADE
frALDAS, o SoNo – oS cuiDADoS
Do corPo QuE vÃo ALÉm...
Nos momentos de banho, da troca de fraldas, quando se põe para dormir, há uma 
intensa troca de toques, por isso esses momentos são especiais para as crianças. Neles 
elas percebem se estão sendo tocadas com 
carinho, raiva ou indiferença. Elas também 
vão percebendo quem é a criança preferida 
e por que, e de que modo ela é convidada a 
se alimentar. 
Na relação estabelecida, por exemplo, 
no momento de tomar a mamadeira, 
seja com a mãe ou com o professor de 
educação infantil, o binômio dar e receber possibilita às crianças aprenderem 
sobre si mesmas e estabelecerem uma 
confiança básica no outro e em suas pró-
prias competências (p.17, v. 2).
Esse processo vai construindo a autoconfiança da criança e dando-lhe informações 
corporais, visuais e de oralidade sobre ela e 
sobre os outros. É importante, portanto, que 
a educadora observe seu modo de atuar nesses momentos e que reflita sobre quem escolhe primeiro para receber esses cuidados. 
É sempre a mesma criança? Por qual motivo? Como olha para cada uma das crian-
ças quando as está alimentando ou dando 
banho? Como as chama? Dá-lhes apelidos? 
Quais? Por quê? Como toca seus cabelos? 
Penteia-os? O que lhes diz?
Essas interações dão às crianças referências 
positivas ou negativas sobre si mesmas, sobre seu jeito de ser, sobre seus cabelos, a 
cor de sua pele, seus olhos. As educadoras, 
nessa interação, estarão mediando as interpretações entre o que os pares (as outras 
crianças) pensam e o que cada criança pensa de si mesma. No volume 2 do RCNEI está 
colocado que:
A autoestima que a criança aos poucos 
desenvolve é, em grande parte, interio-28
rização da estima que se tem por ela 
e da confiança da qual é alvo. Disso 
resulta a necessidade de o adulto confiar e acreditar na capacidade de todas 
as crianças com as quais trabalha. A 
postura corporal, somada à linguagem 
gestual, verbal etc. do adulto, transmite informações às crianças, possibilitando formas particulares e significativas de estabelecer vínculos com elas. 
É importante criar situações educativas para que, dentro dos limites impostos pela vivência em coletividade, 
cada criança possa ter respeitados os 
seus hábitos, ritmos e preferências individuais. Da mesma forma, ouvir as 
falas das crianças, compreendendo o 
que elas estão querendo comunicar, 
fortalece a sua autoconfiança (p. 31).
A tarefa da educadora que se pretende antirracista deve incluir a conversa pedagógica. 
É importante falar com um bebê enquanto lhe dá banho, troca as fraldas ou o faz 
dormir, dizendo-lhe: como são lindos seus 
olhos – sejam eles azuis, pretos, amendoados, “puxadinhos” ou de qualquer outro formato e cor – como sua pele é macia, seja 
branca, nas suas infinitas variações, ou negra, nas suas infinitas variações, ou ainda 
como seus cabelos são gostosos de serem 
acariciados, sejam crespos ou lisinhos... Essas são formas de construir um autoconceito positivo na criança. Um dos conteúdos a 
serem trabalhados com as crianças de 0 a 
3 anos, de acordo com o RCNCEI, v. 2, é o 
Reconhecimento progressivo do próprio corpo 
e das diferentes sensações e ritmos que produz 
(p.30). Para as crianças de 3 a 6 anos, os RCNEI ainda são mais explícitos, pois está posto, na p. 38 do v. 2, que um dos conteúdos 
a serem trabalhados com as crianças nessa 
idade é o Respeito às características pessoais 
relacionadas ao gênero, etnia, peso, estatura 
etc. Portanto, essas atitudes em educadores, 
longe de ser uma ação de boa vontade, são 
um cumprimento do dever profissional.
4.3. movimENTo – 
ExPrESSiviDADE, EQuiLíbrio, 
coorDENAÇÃo...
As maneiras de andar, correr, arremessar, saltar resultam das interações 
sociais e da relação dos homens com 
o meio; são movimentos cujos significados têm sido construídos em função 
das diferentes necessidades, interesses 
e possibilidades corporais humanas 
presentes nas diferentes culturas em 
diversas épocas da história (v. 3, p. 16).
Movimentar-se faz parte da ação humana, 
nós nos movimentamos instintivamente, 
porém graças à capacidade dos seres humanos de refletir sobre o que fazem, muitos movimentos foram transformados em 
simbologias, adquirindo significados particulares para cada grupo ou comunidade. 
É por isso que em algumas culturas os ho-29
mens beijam-se em sinal de respeito e, em 
outras, isto é proibido. Neste conteúdo está 
uma rica oportunidade de as educadoras 
trabalharem com as crianças os gestos que 
servem como meios de comunicar algo e 
suas possibilidades distintas, dependendo 
da cultura. Também é pertinente o estudo 
de danças produzidas em diferentes culturas, ou mesmo as danças existentes no Brasil que agregaram elementos das culturas 
negras, indígenas e brancas. Crianças ainda 
bem pequenas gostam de dançar ao som de 
músicas que podem ser oriundas de variados grupos étnico-raciais. A capoeira é um 
universo muito importante, pois conjuga a 
música, a dança, o jogo. Os jogos, as brincadeiras, a dança e as práticas esportivas revelam, por seu lado, a cultura corporal de cada 
grupo social, constituindo-se em atividades 
privilegiadas nas quais o movimento é aprendido e significado (RCNEI, v 3, p.20).
Apresentar para as crianças esse universo 
de dança, ritmos, prática esportiva será bastante instigante e trará sempre novidades. 
Do mesmo modo, podemos pensar os conteúdos relativos às músicas. Todos os grupos humanos cantam, então, por que não 
proporcionar às crianças, desde muito cedo, 
o encontro com músicas de vários lugares 
do mundo? As crianças são muito curiosas, 
como sabemos. Elas ouvem e querem saber 
o que está sendo dito, ou porque estão cantando daquele jeito etc. Querem repetir, refazer, fazer diferente. São momentos oportunos para introduzir as percepções de que 
todos os povos, inclusive o povo negro, têm 
músicas para diferentes situações, nascimento, morte, casamento, aniversários, entre outras festividades. Investigar isso será 
uma caminhada estimulante. Também é o 
momento ideal para questionar músicas e 
brincadeiras musicais que sejam preconceituosas. Muitas destas brincadeiras são mantidas nas salas de aula sob o argumento de 
que fazem parte do folclore brasileiro, mas 
sabemos que a sociedade brasileira produz 
e reproduz o racismo, por isso, temos que, 
inclusive, reconstruir coisas do nosso folclore, é por isso que somos sujeitos pensantes, 
capazes de mudar coisas.
Podem surgir desses conteúdos pesquisas 
sobre lugares do continente africano, tipo 
de dança e música, rituais, produção de 
instrumentos musicais, enfim, muita ação 
e aprendizagem na qual estarão presentes 
as duas dimensões do trabalho com a mú-
sica na educação infantil – o fazer musical 
e a apreciação – e também a aprendizagem 
sobre a história dos negros brasileiros e da 
África, dando cumprimento ao que prevê a 
Lei n. 10.639/03.
4.4. ArTES viSuAiS – o fAzEr 
ArTíSTico, A APrEciAÇÃo E A
rEfLExÃo
Todos os povos representam, artisticamente, sentimentos, desejos, fatos ou ideias que 30
fazem parte de um determinado momento 
histórico de suas vidas. No trabalho com 
as artes visuais, é importante proporcionar 
às crianças o contato com os mais variados 
tipos de manifestações artísticas, modelagem, esculturas, instalações, telas entre outros. Elas devem aprender a apreciar a arte 
já produzida e serem estimuladas a produzir também a sua arte. Nesse processo de 
ensinar e estimular o contato com a arte, 
muitas escolas têm realizado trabalhos de 
apreciação, reflexão e fazer artísticos a partir de trabalhos de pintores famosos, como 
Picasso, Miró etc.
Neste conteúdo, não podemos perder a 
oportunidade de apresentar para as crian-
ças a produção das artes visuais dos povos 
africanos e indígenas. Elas são riquíssimas e 
ampliarão bastante a concepção das crian-
ças sobre quem faz arte. A ideia de que a população negra brasileira e africana produz 
artes visuais ainda é muito restrita. Sempre 
que vemos alguém falar da arte negra, a pessoa está se referindo à capoeira, à comida 
ou alguma coisa do tipo. Faz-se necessário 
ampliar esse universo. Sugiro que em todos 
os níveis da educação infantil, ao trabalhar 
o conteúdo Fazer Artístico, as crianças possam conhecer os “fazeres artísticos” de diferentes povos, com destaque para os povos 
negros, sendo incentivadas sempre a se perguntarem como e por que esses povos produzem arte, pois tais perguntas permitirão 
que elas se aproximem de histórias, crenças 
e valores dos grupos estudados. Tal procedimento também se aplica ao conteúdo Apreciação em artes visuais, pois, como já dissemos, ao lado de Picasso, é preciso conhecer 
os artistas negros brasileiros e africanos. As 
recomendações nos Referenciais para este 
tipo de trabalho são de que:
As crianças podem observar imagens 
figurativas fixas ou em movimento 
e produções abstratas. Se for dada a 
oportunidade para o trabalho com objetos e imagens da produção artística 
(regional, nacional ou internacional), 
se for possibilitado o contato com artistas, as visitas às exposições etc., o 
professor estará criando possibilidade 
para que as crianças desenvolvam relações entre as representações visuais 
e suas vivências pessoais ou grupais, 
enriquecendo seu conhecimento do 
mundo, das linguagens das artes e 
instrumentalizando-as como leitoras 
e produtoras de trabalhos artísticos 
(RCNEI, v. 3, p. 96).
Dar às nossas crianças a oportunidade de 
conhecer modos de representar o mundo e 
os sentimentos de diferentes povos é construirmos com elas a concepção de igualdade 
e irmandade entre os seres humanos. Todos 
são capazes e fazem arte.31
4.5. fALAr E EScuTAr, PráTicAS
DE LEiTurA E PráTicASDE
EScriTA
A educação infantil, ao promover experiências significativas de aprendizagem da língua, por meio de um trabalho com a linguagem oral e escrita, se 
constitui em um dos espaços de ampliação das capacidades de comunica-
ção e expressão e de acesso ao mundo 
letrado pelas crianças. Essa ampliação 
está relacionada ao desenvolvimento 
gradativo das capacidades associadas 
às quatro competências linguísticas 
básicas: falar, escutar, ler e escrever 
(RCNEI, v. 3, p. 108).
Há uma tendência na escola a valorizar 
excessivamente o ensino da linguagem escrita, desvalorizando a linguagem oral. Os 
RCNEI chamam nossa atenção para o fato 
de que devemos estabelecer, na prática educativa, espaços para o desenvolvimento das 
duas habilidades, entre outras. Para as educadoras que desejam realizar uma educação 
antirracista, a linguagem oral deve de fato 
ser valorizada, pois muitos povos negros e 
indígenas tinham-na como única forma de 
comunicar e transmitir os conhecimentos 
do grupo. Atualmente, a linguagem escrita 
ganha cada vez mais espaços, mesmo entre 
povos que tinham forte tradição oral, isso 
não quer dizer que devamos desvalorizar 
esse modo de transmissão de conhecimento. É uma ótima oportunidade para pesquisar com as crianças as muitas contribuições 
dos povos negros e indígenas na constru-
ção do nosso idioma, por exemplo, palavras 
como lenga-lenga, xodó, jaburu etc.
Tanto para o desenvolvimento da linguagem oral como para o da linguagem escrita a contação de histórias ocupa um lugar 
de destaque. Nesse sentido, vale identificar 
as pessoas do bairro que são consideradas 
bons/boas contadores/as de “causos” e convidá-las a participar das aulas. Chamar avós 
de diferentes gerações para que contem 
histórias de sua infância para as crianças – 
sempre tendo o cuidado de trazer pessoas 
que representem a diversidade étnico-racial 
– é um atividade muito agradável. Também 
cabe aqui o convite a militantes de grupos 
indígenas e negros para que contem histó-
rias de suas vidas, pode-se convidar clubes 
ou associações que se reúnem a partir do 
critério de etnicidade ou raça. Essas pessoas 
e grupos darão um sabor e um ritmo especial aos momentos dedicados ao desenvolvimento da linguagem oral e escrita, elas poderão ensinar cantos típicos de seu tempo 
ou grupo, parlendas, ditados etc. 
Em ambas as habilidades é preciso criar um 
espaço para a literatura. Ela será o veículo 
no qual as crianças tomarão contato com 
contos, lendas, mitos e histórias africanas 
e indígenas. Achamos muito natural que as 
crianças brasileiras conheçam as histórias 32
do Chapeuzinho Vermelho, dos Três porquinhos, do Gato de botas e todos os contos 
de culturas europeias e nada conheçam dos 
contos africanos e indígenas, povos com 
presenças tão fortes em nosso cotidiano. 
Vamos contar para nossas crianças as histórias: Caçadores de aventuras, contos africanos ou a história do Reizinho do Congo. 
Há caminhos para enriquecer o universo 
infantil com referenciais de literatura que 
vão além dos europeus, o que precisamos é 
estar alertas quando realizamos nosso planejamento para que a riqueza dessas produções não seja ignorada. 
4.6. NATurEzA E SociEDADE
Algumas práticas valorizam atividades com festas do calendário nacional: 
o Dia do Soldado, o Dia das Mães, o 
Dia do Índio, o Dia da primavera, a 
páscoa etc. Nessas ocasiões, as crian-
ças são solicitadas a colorir desenhos 
mimeografados pelos professores, 
como coelhinhos, soldados, bandeirinhas, cocares etc., e são fantasiadas 
e enfeitadas com chapéus, faixas, espadas e pinturas. Apesar de certas 
ocasiões comemorativas propiciarem 
aberturas para propostas criativas de 
trabalho, muitas vezes os temas não 
ganham profundidade nem o cuidado necessário, acabando por difundir 
estereótipos culturais e favorecendo 
pouco a construção de conhecimentos sobre a diversidade de realidades 
sociais, culturais, geográficas e histó-
ricas (RCNEI, v. 3, p. 154).
Este item e suas subdivisões são tão ricos 
para o trabalho da educação antirracista 
que, por mais proposições que façamos, não 
será possível abarcar minimamente todas as 
possibilidades que ele traz. Para facilitar um 
pouco mais nossa reflexão, destaco alguns 
itens deste eixo estabelecidas nos RCNEI v. 
3, procurando o quanto possível indicar caminhos para o trabalho e o desenvolvimento 
de atividades de uma educação antirracista.
4.6.1. orGANizAÇÃo DoS
GruPoS E SEu moDo DE SEr, 
vivEr E TrAbALhAr, oS LuGArES
E SuAS PAiSAGENS, obJEToS E
SuAS TrANSformAÇõES, oS
SErES vivoS E oS fENômENoS
DA NATurEzA
Um dos conteúdos previstos no RCNEI 
para as crianças nessa faixa etária prevê que devamos estimular a participa-
ção em atividades que envolvam histó-
rias, brincadeiras, jogos e canções que 
digam respeito às tradições culturais 
de sua comunidade e de outros grupos 
(v. 3, p. 165). Já abordamos, em outros 
momentos desse texto, como podemos 
fazer isso. Esse trabalho implica, também, o conhecimento de seus pares e 33
suas histórias, saber de onde veio o seu 
amigo, conhecer histórias da vida de 
sua colega, relacionar as profissões e 
os saberes que pais, avós, tios e outros 
parentes reúnem. tudo isto faz parte 
desse eixo e proporciona às crianças 
muitas informações que as ajudarão 
a compreender a diversidade de pessoas que as 
cercam. por 
que há muitas 
pessoas de origem asiática 
trabalhando 
com vendas, 
por exemplo, e 
por que outros 
grupos, de origens diferentes, trabalham 
com coisas diferentes? É um 
tema que abre margens a muitas abordagens e estimula a conhecer o outro.
As crianças poderão construir maquetes de 
sucatas para representar as diferentes paisagens de lugares da África, rompendo com 
a ideia mais divulgada na mídia de que este 
seja apenas um continente devastado. Podem ser mostrados filmes, fotos, nos quais 
os lugares e as paisagens sejam diferentes, 
possibilitando que as crianças compreendam 
o continente africano em toda a sua riqueza, 
em diferentes épocas. Elas poderão produzir 
desenhos comparativos entre Brasil e África. 
Turmas diferentes podem realizar projetos 
com lugares e paisagens distintas e depois 
trocarem entre si seus conhecimentos. No 
que se refere aos objetos e suas transformações, também aqui podem ser realizados 
trabalhos comparativos sobre a utilização de 
um objeto, por exemplo, os talheres – quais 
culturas usam talheres ou que tipo de 
objetos são utilizados para a alimentação? São sempre 
iguais? Por que são 
diferentes? Em que 
são diferentes? Sempre foram do mesmo 
jeito? As mesmas 
questões podem ser 
feitas com os instrumentos musicais.
Existem sempre oportunidades de incluir 
no planejamento a questão da diversidade 
cultural, destacando as populações negras e 
indígenas, por serem estas as que mais sofrem preconceito e discriminação. Quando 
as educadoras forem tratar do conteúdo seres vivos, essa será uma excelente oportunidade para verificar os efeitos que o trabalho 
pro-educação antirracista vem produzindo, 
pois neste momento a educadora poderá explicitar a problemática do preconceito e da 
discriminação. É necessário observar as rea-
ções das crianças, coletar suas ideias sobre 
Existem sempre 
oportunidades de incluir 
no planejamento a questão 
da diversidade cultural, 
destacando as populações 
negras e indígenas, por 
serem estas as que mais 
sofrem preconceito e 
discriminação. 34
os diferentes povos e se necessário produzir 
intervenções, a fim de reforçar suas atitudes 
antidiscriminatórias, verificando o quanto 
está fortalecida a percepção da igualdade 
de direitos entre elas e identificando quais 
são, ainda, as necessidades do grupo para 
melhorar seus conhecimentos sobre o tema 
e adquirir uma atitude positiva diante das 
diferenças étnico-raciais.
4.6.2. mATEmáTicA – JoGoS
E APrENDizAGEm DE NoÇõES
mATEmáTicAS
Alguns conteúdos específicos da Matemá-
tica podem ser abordados com o olhar da 
educação antirracista, sobretudo se permitimos às crianças se perguntarem como os diferentes povos registravam as quantidades 
de coisas que possuíam, sejam elas alimentos, animais ou outra coisa qualquer. Há um 
espaço riquíssimo no estudo do conhecimento matemático para incluir a produção 
do povo africano. É no estudo da geometria 
que recomendo o maior enfoque. Podemos 
estudar as muitas formas geométricas que 
existem partindo de desenhos africanos. Essas formas estão presentes no cotidiano dos 
povos africanos, nos penteados de cabelos, 
nos desenhos dos tecidos, nas pinturas e esculturas, na produção do artesanato ou em 
jogos e brincadeiras, ou mesmo na simbologia religiosa e na representação dos valores. 
Uma breve pesquisa na internet dá ao educador inúmeros exemplos de desenhos que 
podem ser explorados junto às crianças.
coNSiDErAÇõES fiNAiS
Tivemos duas intenções principais ao escrever esse texto. A primeira, de caráter mais 
objetivo, visa colaborar com as educadoras 
que trabalham na educação infantil no encontro de caminhos para implementação da 
Lei n. 10.639, aprovada em janeiro de 2003, 
que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e inclui no currículo oficial de escolas públicas e privadas de Ensino Básico a 
obrigatoriedade do ensino da temática História e Cultura Afro-brasileira e Africana, e 
cumprimento aos princípios das Diretrizes 
Curriculares Nacionais para a Educação das 
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de 
História e Cultura Afro-brasileira e Africana, 
de 2004. A segunda intenção, mais subjetiva, 
está permeada do desejo de ter ampliado o 
números de pessoas que compreendam o 
currículo da educação infantil como fonte 
inesgotável na qual jorram possibilidades de 
matar a sede existente na educação brasileira de conteúdos que transmitam conhecimentos positivos sobre os povos negros 
e indígenas e que os considerem como conhecimentos absolutamente indispensáveis 
para que nossa sociedade possa eliminar o 
racismo, o preconceito e a discriminação.35
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