quinta-feira, 4 de julho de 2013

10 anos da Lei 10.639/93

 
IHU – Unisinos – Instituto Humanitas Unisinos – Adital
Terça, 23 de abril de 2013.
“Não basta promulgar uma lei; precisa mudar a mente das pessoas e seus posicionamentos”, declara a secretária do Grupo de Trabalho Negros: História, Cultura e Sociedade – ANPUH/RS.
Uma reivindicação do Movimento Social Negro, a Lei n. 10.639/3, que inclui no currículo oficial das escolas a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro-brasileira, completa dez anos. Apesar de alguns professores ainda serem resistentes à legislação, Lúcia Regina Pereira ressalta que “diferente de dez anos atrás, mais pessoas, escolas, e educadores têm ciência, se não consciência, dessa outra parcela da população que precisa se ver na história e se ver de forma positiva”.
Para ela, a instituição desta lei “prevê uma revolução na educação do país ao mostrar que o Brasil foi construído a partir de vários grupos étnicos: o grupo indígena, o grupo negro e o grupo europeu, e que essas histórias todas têm que vir à tona para entendermos como funciona a sociedade brasileira”. Em entrevista à IHU On-Line por telefone, Lúcia assinala que “muitas escolas ainda pensam que fazer uma atividade no dia 20 de novembro contempla a questão da lei, mas a proposta não é essa”.
E acrescenta: “A proposta é que se integre no currículo propriamente dito e no currículo culto da escola, nas próprias relações interpessoais, para que as pessoas tenham consciência do tratamento. Então, esta questão tem de deixar de ser uma coisa pontual e festiva. A cultura tem que ser tratada como uma questão educacional, como uma questão de organização social. A cultura, neste momento, é extremamente importante, e ela tem que perpassar todo o processo educacional”.
Lúcia Regina Pereira é mestre e doutora em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. Leciona nas redes estadual e municipal de ensino. Também é integrante do Grupo de Pesquisa Africanidades, Ideologia e Cotidiano – AIC (PPGH/PUCRS), coordenadora técnica de Maria Mulher –Organização de Mulheres Negras, Secretária do GT Negros: História, Cultura e Sociedade – ANPUH/RS. Ela estará na Unisinos na noite de hoje, 23-04-2013, ministrando a palestra Os 10 anos da lei n. 10.639/3: Avanços e perspectivas, às 19h30, no Auditório Central.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como e em que contexto foi sancionada a lei n. 10639/3?
Lúcia Regina Pereira – Esta lei é resultado de um processo muito longo de trabalho e de reivindicação das organizações negras do final do século XIX e início do século XX. Em meados do século XX, essa discussão foi proposta pela instituição da Frente Negra Brasileira, que atuou de forma mais incisiva politicamente. E, nos anos 1970, o movimento negro atuou politicamente e concretizou essa reivindicação sobre a questão negra da educação no sistema de ensino. Esse processo vem se desenvolvendo desde o período colonial com as Irmandades do Rosário, que sempre tiveram na pauta das suas ações a preocupação também com a educação.
IHU On-Line – Como a lei é abordada nas escolas, entre professores e alunos?
Lúcia Regina Pereira – Num primeiro momento, houve resistência. Ouvia colegas dizendo que não iriam cumprir a lei porque era uma coisa vinda de cima. Na realidade, há um desconhecimento do processo histórico da instituição da lei. Ela não veio de cima, não foi a presidência da República que propôs; foi uma reivindicação do Movimento Social Negro. As pessoas ainda ficam com “o pé atrás”, porque acham que é preciso ter leis para outros segmentos discriminados da sociedade, mas não é assim que funciona. A instituição da lei prevê uma revolução na educação do país para mostrar que o Brasil foi construído a partir de vários grupos étnicos: o grupo indígena, o grupo negro e o grupo europeu, e que essas histórias todas têm que vir à tona para entendermos como funciona nossa sociedade.
Ainda hoje há aqueles que são resistentes à lei. Porém, o lado bom é que, diferente de dez anos atrás, mais pessoas, escolas e educadores têm ciência, se não consciência, dessa outra parcela da população, a qual precisa se ver na história e se ver de forma positiva.
IHU On-Line – Como a história e cultura afro-brasileira eram abordadas na educação nacional antes da instituição da lei n. 10639/3, e o que mudou no ensino após a instituição da lei?
Lúcia Regina Pereira – A história era vista com muitos estereótipos. Primeiro, quando os negros apareciam na dita história, apareciam como acessórios. A história africana foi ligada à história das grandes navegações. Então, a história do negro aparecia a partir do colonialismo. Nas imagens pejorativas, o negro era visto como escravo, como o mau trabalhador e como uma pessoa que não tinha condições devido à falta de civilidade, de trabalhar e progredir. Embora existam restrições, ainda hoje algumas pessoas não aceitam a revisão histórica e veem a sociedade de uma forma eurocêntrica e acham que as coisas devem continuar do jeito que estão.
Por outro lado, existem pessoas imbuídas desta ideia de ver o Brasil, de fato, na sua multiculturalidade e, nessa, a população negra – que é 53% da população – tem um papel fundamental naquilo de bom, que é a preservação da cultura, as relações interpessoais, a questão da religião, a questão da culinária etc.
A lei entrou para o calendário oficial da escola e, mal ou bem, elas são obrigadas a olhar para este tema. Algumas estão trabalhando durante todo o ano, outras trabalham de forma pontual. Então, muito mais pessoas, tanto professores do Censo quanto alunos, acabam tendo um contato, mínimo que seja, com a cultura afro-brasileira.
IHU On-Line – Quais os avanços e perspectivas dez anos após a instituição da lei n. 10639/3?
Lúcia Regina Pereira – Eu diria que a perspectiva é de avanço, até porque ela é uma lei revolucionária. Eu gosto muito de dizer isso, visto que ela muda todo o sistema de ensino do país, desde a educação infantil até o ensino superior. Em termos de mudança social, as pessoas serão obrigadas a mudar seus pensamentos, suas visões simbólicas do mundo e das relações sociais no Brasil. Então, isso é revolucionário. Não se trata apenas de incluir conteúdos na sala de aula, mas também de pensar o fazer individual, o fazer de cada pessoa no dia a dia. Como eu trato aquele que é diferente? Como eu trato as questões étnico-raciais na sala de aula? Além da questão do conteúdo propriamente dito, as pessoas terão que olhar para seu comportamento e ver até que ponto – ou até onde – vão as limitações em aceitar o outro como produtor de história, como produtor de cultura, que é uma cultura relevante. E, se não fosse essa cultura, com certeza o Brasil seria diferente.
IHU On-Line – Quais são hoje as principais reivindicações do movimento afrodescendente?
Lúcia Regina Pereira – Em matéria de publicação, diferente de dez anos atrás, existe um bom número de publicações relacionadas à questão do negro. Esse é um ponto extremamente positivo. Outro ponto é que a lei se efetive de fato, porque, dada a resistência da cultura brasileira, alguns municípios de tradição germânica ou outra qualquer pensam que não é importante falar de negros na sua localidade. Estamos aprendendo a história do país, e na história do país precisa estar incluída a de todos os segmentos. É importante fazer com que isso realmente se efetive. Não basta promulgar uma lei; precisa mudar a mente das pessoas e os seus posicionamentos.
Muitas escolas ainda pensam que fazer uma atividade no dia 20 de novembro contempla a questão da lei, mas a proposta não é essa. A proposta é que se integre no currículo propriamente dito e no currículo culto da escola, nas próprias relações interpessoais, para que as pessoas tenham consciência do tratamento. Então, esta questão tem de deixar de ser uma coisa pontual e festiva. A cultura tem que ser tratada como uma questão educacional, como uma questão de organização social. A cultura, neste momento, é extremamente importante, e ela tem que perpassar todo o processo educacional.
Os professores e professoras que estão se formando precisam ter conhecimento dessa lei, para quando forem exercer a sua profissão saberem como trabalhar a temática dentro da sala de aula. Então, é uma via de duas mãos. A questão da pesquisa também é fundamental. Por muito tempo se pesquisou a população negra da sociedade como se ela fosse um apêndice invisível, e hoje nós temos pesquisas direcionadas que vão reverter em prol dessa população que tanto foi excluída na sociedade brasileira.
Notícia colhida no sítio http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=74888

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Projetos promovem ensino de cultura afro-brasileira nas escolas

Projetos promovem ensino de cultura afro-brasileira nas escolas


por Luana Costa, do Blog Educação
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A Lei nº 10.639, que torna obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira nos currículos do ensino fundamental e do ensino médio, completou uma década em 2013. Apesar do tempo, o tema ainda está longe das salas de aulas. De acordo com o Siga Brasil, sistema de informações sobre orçamento público, pouco mais de 11% da verba reservada para projetos educacionais que promovam a igualdade racial foi usada em 2012.
Porém, alguns projetos educativos decidiram atuar por conta própria no fomento à cultura afro-brasileira nas escolas. É o caso da Associação Harmonicanto, do Rio de Janeiro (RJ), que criou o projeto Cantar e Contar Clementina – Outra Forma de Aprender, realizado no contraturno das escolas públicas. “Utilizamos a história da cantora e compositora Clementina de Jesus para trabalhar questões históricas, sociais, raciais, de discriminação, de gênero e de resgate da cultura afro-brasileira”, explicou Ellis Amorim, assessora técnica do projeto. O trabalho é feito com 70 crianças de 4 a 12 anos de idade. “O projeto faz com que esses alunos tornem-se cidadãos conscientes de seus direitos, deveres e possibilidades futuras”, contou.
Para Cássia Oliveira, coordenadora executiva da associação, o ensino da cultura afro-brasileira nas escolas é importante não só para conscientizar os alunos, mas também para elevar a autoestima dos afrodescendentes. “A cultura afro-brasileira, a despeito de sua influência na formação de nosso patrimônio cultural, foi discriminada ao longo da história. Proporcionar a valorização desta cultura na escola é resgatar nossas origens e contribuir para a elevação da autoestima afrodescendente”, disse.
A atividade está dando resultados e, hoje, é possível que as crianças passem a se identificar com a história da cantora. “Dentre outras abordagens, relatamos experiências da infância relacionadas à família de Clementina, comparando-as com a realidade vivida pelas crianças hoje. Ao apresentarmos fotos da artista, os alunos puderam observar seus traços fortes, herança característica de afrodescendentes, como a cor negra, lábios grossos, cabelos crespos. A maioria prontamente conseguiu identificar pontos em comum com as características de Clementina em si mesmos ou na família”, relatou Oliveira.
No Distrito Federal, a Secretaria Especial da Igualdade Racial – SEPIR-DF desenvolveu o projeto SEPIR nas Escolas, cujo foco é o debate de questões étnico-raciais com alunos da educação básica. “A necessidade de inserir a cultura afro-brasileira nas escolas é tão forte que muitas instituições entram em contato para irmos até lá promover nossas ações”, declarou a gerente de desenvolvimento econômico, social e étnico-racial, professora Waldicéia de Moraes Texeira da Silva.
As atividades do projeto envolvem palestras, oficinas, jogos e brincadeiras com temas que não são abordados nos livros didáticos. “Falamos sobre a importância do sistema de cotas, dos movimentos sociais negros, entre outros temas, com base na história, filosofia e sociologia”, disse a professora. “Nosso objetivo também é desconstruir o processo de criminalização dos movimentos sociais no Brasil”, completou.
Para Silva, quando a criança entra na escola, ela enfrenta o preconceito de forma mais agressiva. E é justamente nesse período que se deve promover a conscientização. “Há pesquisas que apontam que o caráter do adulto é formado entre zero e seis anos de idade. Por isso, é no início da vida que a formação deve ser feita. Acredito que, dessa forma, podemos diminuir o preconceito racial ainda tão presente em nossa sociedade”, declarou. A professora afirma, ainda, que é necessário promover uma formação melhor entre os educadores. “Nossos professores não foram formados para tratar de questões raciais na escola. Por isso, a SEPIR também trabalha dentro de instituições de ensino superior para formar futuros pedagogos que levem a questão para dentro das escolas”, afirmou.
O coordenador de relações estratégicas da ONG Educap, Reginaldo Lima, afirma que trazer as questões étnico-raciais para a escola é, também, aproximar a realidade do aluno do ambiente escolar. “Na escola, não existe um universo que trate diretamente das questões afro-brasileiras. Mas tratar de cultura negra é promover um espaço democrático, que eleve a autoestima do aluno, muitas vezes evadido por não se identificar com a escola”, disse.
Para ele, é extremamente necessário que a questão entre no Projeto Político Pedagógico – PPP das escolas. “Entendo que a escola é um ponto de partida para fomentar a discussão do preconceito. Precisamos privilegiar a discussão, não colocar um indivíduo acima do outro. Essa é uma forma de evoluir. Precisamos tornar as crianças e adolescentes geradores das soluções de seus próprios problemas”, disse. A ONG Educap atua no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, com projetos focados na diminuição da evasão escolar.
* Publicado originalmente no Blog Educação.
(Blog Educação)

Faltam professores qualificados em cultura afro-brasileira


13/05/2013 17h47 - Atualizado em 13/05/2013 17h47

Faltam professores qualificados em cultura afro-brasileira, diz especialista

Lei determina o ensino da cultura afro em escolas públicas e particulares.
UFSCar oferece cursos em educação para as relações etnicorraciais.

Do G1 São Carlos e Araraquara
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O ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas de ensino fundamental e médio, particulares e públicas, é previsto em lei desde 2003.  As aulas ajudam a ampliar a tolerância e o respeito, além de melhorar a convivência entre as crianças. Apesar da obrigatoriedade, a coordenadora do Centro de Cultura Afro de Araraquara (SP), Alessandra Laurindo, diz que ainda faltam professores capacitados. “A grande maioria ainda não tem conhecimento sobre o tema para poder passar para os alunos”, afirmou.
O estudante Domini Laurindo Alto, de 9 anos, foi vítima de preconceito antes de mudar para uma escola que oferece o ensino da cultura afro. “Falavam que eu era negrinho e me chamavam de macaco. Agora ninguém me maltrata, ninguém me xinga”, contou.

Desde o ano passado, a professora Maria Fernanda Luiz leva livros e atividades temáticas para a sala de aula. “Alunos que tinham postura discriminatória e, até um ponto, racistas, mudaram e atualmente questionam atitudes assim que eles veem”, disse a Maria Fernanda.
Professora de Araraquara leva livros de cultura afro à sala de aula (Foto: Paulo Chiari/EPTV)Professora de Araraquara leva livros de cultura afro à sala de aula (Foto: Paulo Chiari/EPTV)
Em meio a brincadeiras, as crianças aprendem uma lição importante. “Todo mundo é humano, só as características é que são diferentes”, afirmou o estudante Otávio Monteiro, de 9 anos.

Região
A Secretaria de Educação de São Carlos informou que desenvolve várias atividades sobre a cultura afro nas escolas municipais. O projeto mais recente, chamado “Caixa de Africanidades”, consiste em seis baús com instrumentos musicais, livros e outros elementos da cultura africana, que vão percorrer as escolas durante este ano.

Em Rio Claro, a Prefeitura informou que a lei está sendo aplicada na rede municipal desde o ano passado e que o tema é abordado em várias matérias. Ainda de acordo com a Prefeitura, os professores estão sendo preparados desde 2012.

Qualificação
O Núcleo de Estudos Afrobrasileiro (Neab), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), oferece em parceira com a Universidade Aberta do Brasil (UAB) o curso de especialização em Educação para as Relações Etnicorraciais, voltado para professores da rede pública municipal ou estadual. As aulas são ministradas a distância, com provas presenciais em polos de apoios em 13 municípios. O curso tem duração de dois anos.
“No dia 15 de junho formaremos a primeira turma do curso de especialização. São mais de 400 professores da rede municipal de ensino do Estado. Além disso, o Neab está realizando um curso de formação de mais de três mil professores da região”, explicou Thais Fernanda Leite Madeira, coordenadora adjunta dos cursos.
Mais informações podem ser obtidas no site do Núcleo de Estudos Afrobrasileiro.
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Há 10 anos, lei prevê o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas, em Araraquara (Foto: Paulo Chiari/EPTV)Há 10 anos, lei prevê o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas (Foto: Paulo Chiari/EPTV)
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