quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Lei nº 11.645 Como Trabalhar?


Lei nº 11.645
História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena no Currículo
Como Trabalhar?
I- O QUE DIZ A LEI?
Art. 1º
O art. 26-A da Lei nº 9.394, da LEI Nº 11.645, DE 10/03/2008 e 20/12/1996, passa a
vigorar com a seguinte redação:
Art. 26-A
Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e  privados,
torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.
§ 1o
O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da
história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir
desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a
luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e
o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições
nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.
§ 2o
Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas
brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas
áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.
II- TANTAS MENTIRAS QUE PARECEM VERDADES...
a) É índio ou são povos indígenas?
A questão desse índio “genérico” impõe a necessidade de se conhecer a diversidade
cultural, étnica, histórica, lingüística e antropológica dos povos indígenas no Brasil. Não
é  “índio  do Brasil”, mas são  “povos indígenas  no Brasil”. O Brasil é que surgiu,
enquanto nação, após a  anterior  existência dos índios neste território ou nestes
territórios. Há grupos étnicos que habitam mais de um país, como os Guarani, que
ocupam não só o Brasil, mas a Argentina, o Paraguai, a Bolívia e o Uruguai.
Devemos nos referir aos Terena, aos Kaingang, aos Pankararu, aos Fulniô, aos
Saterê Mawê, etc.  (e não aos “índios”),  que são completamente diferentes uns dos
outros: na língua, na religião, na cultura, nos modos de sobrevivência, no processo
histórico de contato com a sociedade não indígena,na cosmovisão, etc.
b) Foi descoberta ou invasão?
É necessário proceder a uma revisão histórica das “grandes navegações” (a
globalização de outrora) e a conseqüente “descoberta” do “novo” mundo. Os povos
indígenas já aqui estavam e eram os verdadeiros donos destas terras. Os portugueses, espanhóis, holandeses, ingleses, franceses, etc. é que invadiram a África, Ásia e
América, que já tinham seus povos milenares.
Recentemente, novos estudos arqueológicos e históricos têm nos levado a reescrever a nossa “pré-história”.
c) Os índios são aculturados?
Do ponto de vista antropológico nenhuma cultura é “pura”, pois  todas  estão em
permanente contato e interação, dada a globalização, o que produz mudanças em todas
as culturas. A questão é que algumas culturas, por serem produzidas por povos
econômica, política e militarmente dominantes, subjugam as culturas produzidas por
povos em situação econômica, política e militar inferior. O que se produz então é a
hegemonia de determinadas culturas – no caso, ocidentais – em especial, as européias e
americana, sobre as culturas minoritárias.
Todas as culturas se transformam e se influenciam permanentemente num processo
que chamamos de interculturalidade. O problema é que a interculturalidade não é
neutra. Há culturas que são hegemônicas e que tendem a abafar e destruir as culturas
minoritárias, usando a língua, a religião, o mercado, a ideologia para se afirmar como a
única cultura, a mais importante, ou a mais avançada
d) São povos do passado?
Costuma-se ainda apresentar ou imaginar os índios como povos antigos, em
processo de extinção, que viviam nus, da caça e da pesca numa floresta exuberante, à
beira de um caudaloso rio.
Nada mais fantasioso e longe da realidade dos povos indígenas reais do Brasil de
hoje: eles estão em franca recuperação demográfica na sua  grande maioria  (fora da
extinção, portanto); têm graves problemas de saúde, urgentes problemas de demarcação
territorial; de  subsistência, pois não  possuem mais, na sua maioria, caça e pesca
abundante para se manterem devido à devastação ambiental que produzimos; de
educação, pois suas escolas (necessidade do contato) ainda possuem professores sem
formação ou professores não indígenas, e infra-estrutura deficiente; tais problemas são
resultado de uma ausência de políticas públicas sociais eficazes.
É destes povos “modernos” que devemos falar na escola: povos que precisam de
postos de saúde, de escolas, de transportes públicos (como camionetes e barcos), de
demarcação de terra, de expulsar de seus territórios invasores como mineradores,
grileiros, madeireiros, fazendeiros, etc.
Mas também, falar da enorme riqueza presente na diversidade cultural deles: suas
literaturas, suas artes, suas festas e cerimônias, suas línguas, seus modos de conceber o
mundo diferente de nós, etc.
e) Tem muita terra pra pouco índio?
Tal afirmativa esconde interesses econômicos  nas terras indígenas e ignora as
diferentes formas de relação social com o trabalho. O trabalho indígena em alguns casos
depende da relação com a floresta, com os rios, com o cerrado, com o sertão, com o
campo, enfim, com a biodiversidade, pois há povos coletores, extrativistas, caçadores, agricultores, etc. A sobrevivência econômica,  entretanto, não é a única condição de
preservação de um povo. Está também em jogo sua reprodução cultural e simbólica, que
depende  da extensão de terra, onde historicamente esse povo nasceu e se reproduziu.
Dele dependem a manutenção de seus cultos, hábitos, cerimoniais, etc.
Atualmente trabalha-se com o conceito de “territorialidades” para explicar as
relações que os povos indígenas  possuem com a terra, o  que  é levado em conta, em
alguns casos de demarcação, como o foi em Raposa Serra do Sol. Em outros casos, o
desrespeito é visível, como é o caso dos Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul.
f) Por que eles não trabalham, como nós?
Nossa  relação de trabalho é  cultural e economicamente capitalista, ocidental e
cosmopolita, onde somos empregados de empresas (públicas ou privadas) ou autônomos
e temos uma jornada diária de trabalho a cumprir, para assegurar uma remuneração
mensal sob a forma de salário.
Os povos indígenas possuem uma enorme variedade de relações de sobrevivência,
que vão desde a extração vegetal ou mineral, a cultura agrícola intensiva ou extensiva, a
coleta e a caça, o artesanato, etc. Alguns povos indígenas, por não possuírem ainda
condições de auto-sustentabilidade, trabalham como empregados temporários para nãoindígenas, em fazendas, mineradoras ou construtoras.
A relação de trabalho deles, portanto, é muito diversa da nossa, pois  depende da
terra, dos rios, da colheita sazonal, da extração mineral ou vegetal, das chuvas, da
produção familiar de artesanato, da plantação, enfim, de uma enorme variedade de
condições sócio-cultural e econômicas que diferem da nossa.
III- FUNDAMENTOS TEÓRICOS
a) Antropológicos:
 Diversidade Cultural, que aponta para a necessidade de respeito à enorme
variedade de culturas indígenas com línguas, religiões, modos de sobrevivência,
economias e cosmovisões diferentes;
 Cognição, Aprendizagem  e Conhecimento,  que indica a existência de formas de
construção de conhecimento específicas produzidas sócio-historicamente pelos
povos indígenas;
 Processos de constituição da pessoa, que demonstra a variedade de processos
sócio-históricos de concepção de sujeito e de sociedade existente entre os povos
indígenas;
 Antropologia das Infâncias, que  deixa claro a contribuição  que a etnologia
indígena e da sociologia da criança, aplicados às sociedades indígenas, podem
trazer para nossa compreensão sobre as crianças.
b) Históricos: A História na perspectiva das minorias étnicas e não só na perspectiva do
colonizador;
 A noção de “Temporalidades”, que inclui o tempo mitológico e não só o tempo
cronológico cartesiano;
 O futuro da Questão Indígena, que aponta para o atendimento urgente às
necessidades de auto-sustentação e autonomia destes povos, como: educação,
saúde, geração de renda, demarcação de terras, etc.
c) Pedagógicos:
 Linguística Aplicada: as línguas indígenas trazem uma rica contribuição aos
estudos lingüísticos, com sua variedade de estruturas, sintaxes, semânticas, etc.;
 Bilinguismo de Transição ou de Resistência: que indica uma opção política a ser
feita aos programas de escolarização indígena que vêm sendo implementados no
Brasil;
 Concepção de Infância: aponta para estudos de etnologia indígena, em especial,
os de natureza etnográfica, que expressam uma lacuna ainda nos nossos estudos
de Sociologia da Criança e Antropologia da Infância a ser preenchida por
antropólogos em parceria com pedagogos;
 Concepção de Aprendizagem: a etnologia indígena mais recente tem indicado a
existência de uma grande variedade de concepções de aprendizagem entre os
povos indígenas, que acompanham suas distintas formas de conceber a
construção da pessoa e  assim, a constituição dos sujeitos, corentes com suas
também distintas, cosmovisões;
 Pedagogias Indígenas: recentes estudos indicam que os povos indígenas,
imersos em processos de escolarização, têm produzido pedagogias “híbridas”, o
que nos interessa conhecer melhor.
Ao se observar as aulas dos professores indígenas numa primeira e superficial
leitura tem-se a impressão que são aulas reproduzidas do modelo da pedagogia
tradicional não indígena. Entretanto, percebe-se que os professores  incorporam
e recriam elementos característicos da pedagogia escolar não indígena e os resignificam de forma criativa ao longo de suas aulas;  transferem também
elementos da educação tradicional indígena para o contexto das relações
pedagógicas da  sala de aula; assim como reproduzem elementos de nosso
modelo não-indígena copiando nossa pedagogia. (Nobre, 2009)
 Processos de Escolarização: segundo o Censo Escolar, em 2006 já havia mais
de 174.000 alunos indígenas, distribuídos em mais de 2.400 escolas em Aldeias,
com mais de 7.000 professores.
IV-PROJETOS PEDAGÓGICOS POSSÍVEIS:
a) História:  Memória e História;
 Mito e História.
b) Literatura:
 Lendas e Mitos Indígenas.
c) Artes:
 Arte e Cultura Material Indígena;
 Artesanato Indígena;
 Pintura Corporal.
d) Matemática:
 Etnomatemática;
 Sistemas de numeração.
e) Geografia:
 Território e territorialidades;
 Questão fundiária.
f) Língua Portuguesa:
 Etimologia de palavras indígenas;
 Literatura Indígena;
 Línguas Indígenas.
g) Ciências:
 Biodiversidade;
 Medicina Alternativa;
 Farmacologia Indígena.
V- FONTES DE CONSULTA:
 “A Temática Indígena na Escola.” Aracy Lopes da Silva e Luís Donisete
Grupioni (Orgs.) MEC/MARI/UNESCO. 1995 “Antropologia, História e Educação. A Questão Indígena e a Escola.” Aracy
Lopes da Silva e Mariana Kawall L. Ferreira (Orgs.) FAPESP/Global/MARI.
2001
 “Práticas Pedagógicas na Escola Indígena.” Aracy Lopes da Silva e Mariana
Kawall L. Ferreira (Orgs.)
 “Idéias Matemáticas de Povos Culturalmente Distintos.” Mariana Kawall L.
Ferreira (Orgs.) FAPESP/Global/MARI. 2002
 “Crianças Indígenas. Ensaios Antropológicos.” Aracy Lopes da Silva; Ana
Vera Lopes da Silva Macedo e Angela Nunes (Orgs.) FAPESP/Global/MARI.
2002
 “Antropologia da Criança”. Clarice Cohn. Zahar 2005
 “Educação Indígena e Alfabetização”. Bartomeu Meliá. Loyola. 1979
 “Leitura e Escrita em Sociedades Indígenas”.Wilmar D´Angelis e Juracilda
Veiga (Orgs)ALB
 “Questões de  Educação Escolar Indígena: da Formação do Professor ao
Projeto de Escola.” Juracilda Veiga e Andrés Salanova (Orgs.) ALB/FUNAI.
2001
 “Desafios Atuais da Educação Escolar Indígena.” Juracilda Veiga e Mª Beatriz
R. Ferreira. (Orgs.) ALB/Min. Esportes.2005
 “Uma Pedagogia Indígena Guarani na Escola, Pra Quê?”  Domingos Nobre.
Editora Curt Nimuendaju. 2009 (Ver como adquirir no site da editora)
 “Formação de Professores Indígenas: Repensando Trajetórias”. Luís Donizete
B. Grupione (Org.) SECAD/MEC 2006 (Disponível no site do MEC)
 “O Índio Brasileiro: O que Você Precisa Saber Sobre os Povos Indígenas no
Brasil de Hoje.” Gersen dos Santos Luciano Baniwa. LACED/UFRJ/MEC
2006. (Disponível no site do MEC)
 “A Presença Indígena na Formação do Brasil” João Pacheco de Oliveira &
Carlos Augusto da Rocha Freire. LACED/UFRJ/MEC 2006. (Disponível no site
do MEC)
VI-VIDEOS:
1- Série: “Índios no Brasil.” SEF/SEED/MEC
2- “Uma Aula Guarani Eté”. Domingos Nobre. Disponível no Youtube3- Série: “Cineastas Indígenas”. Video nas Aldeias
4- Série: DOC TV Cultura: “Mbya Guarani, Guerreiros da Liberdade” e “Contos da
Terra Sagrada”
5- Série: “Xingu”. Rede Manchete
VII- SITES:
CAIK – Centro de Assessoria Intercultural Kondo
www.aldeiaguaranisapukai.org.br
GEPI – Núcleo de Estudos e Pesquisas Indigenistas
www.djweb.com.br/historia
CIMI – Conselho Indigenista Missionário
www.cimi.org.br
Museu do Índio - FUNAI
www.museudoindio.org.br
Portal Kaingang
www.portalkaingang.org
Editora Curt Nimuendajú
www.curtnimuendaju.com
ISA - Instituto SócioAmbiental
www.isa.org.br
Guarani Ñanduti Rogue
www.uni-mainz.de/~lustig/hisp/guarani.html
Associação Guarani Nhe´ê Porá
www.culturaguarani.hpg.ig.com.br
CPI-SP Comissão Pró Índio de São Paulo
www.cpisp.org.br
NEPPI – Núcleo de Estudos e Pesquisas das Populações Indígenas - UCDB – MS
www.neppi.org
CTI – Centro de Trabalho Indigenistawww.trabalhoindigenista.org.br
CCPY – Comissão Pró-Yanomami
www.proyanomami.org.br
COIAB – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira
www.coiab.com.br
CIR – Conselho Indígena de Roraima
www.cir.org.br
Domingos Nobre
donobre@gmail.com        www.aldeiaguaranisapukai.org.br/lei

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